Brasil: Lei de Biossegurança viola princípios da precaução, democracia e independência e harmonia entre poderes

Ao concentrar a decisão sobre transgênicos, a CTNBio fere o pacto federativo, que prevê cooperação entre as esferas de governo na execução de políticas públicas, e fragmenta o Sistema Nacional de Meio Ambiente - SISNAMA

Nesta segunda-feira (20), o procurador-geral da República, Cláudio Lemos Fonteles, ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn) contra a Lei de Biossegurança (Lei 11.105). Na Ação, Fonteles questiona a competência da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) para "deliberar em última e definitiva instância" se um organismo transgênico é ou não causador de impacto ambiental e decidir se sua liberação para uso comercial requer ou não licenciamento ambiental. Para o procurador-geral, a Lei viola os princípios da precaução, da democracia e da independência e harmonia entre os poderes.

Ao concentrar a decisão sobre transgênicos, a CTNBio fere o pacto federativo, que prevê cooperação entre as esferas de governo na execução de políticas públicas, e fragmenta o Sistema Nacional de Meio Ambiente - SISNAMA. Proteger o meio ambiente e combater a poluição em todas as suas formas é dever constitucional compartilhado entre Municípios, Estados e União. E sobre esse aspecto o STF já se pronunciou, declarando inconstitucional, em novembro de 2000, uma lei aprovada pela Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul que impedia o Estado de fiscalizar atividades envolvendo transgênicos (alegando que a fiscalização era de competência exclusiva do Governo Federal).

Os organismos geneticamente modificados são diferentes daqueles obtidos através de cruzamentos naturais ou do melhoramento genético chamado de clássico. O fato de terem recebido genes alienígenas em seus genomas confere aos transgênicos a possibilidade de apresentar efeitos adversos e imprevisíveis, cujos impactos ecológicos são muitas vezes desconhecidos. O reconhecimento desses riscos está na base de todas as leis de gerenciamento do uso de organismos transgênicos, inclusive na brasileira, e também no Protocolo de Cartagena de Biossegurança, assinado por mais de cem países.

Ao dar à CTNBio o poder de decidir se organismos transgênicos são ou não causadores de significativo dano ao meio ambiente, a Lei de Biossegurança submete apenas ao arbítrio da Comissão a decisão sobre a necessidade de Estudos de Impacto Ambiental previamente à liberação comercial destes produtos, o que constitui flagrante desrespeito à Constituição Federal. Nos termos da ADIn, "Chega a ser sintomática a obsessão do legislador ordinário de retirar do órgão federal de licenciamento (IBAMA) a competência para analisar as implicações ambientais da liberação do cultivo de sementes geneticamente alteradas, condicionando o processo de licenciamento ambiental a um juízo prévio pela CTNBio de que o OGM em questão seria potencialmente causador de significativo impacto ambiental (...)".

A ADIn atende a representações do Partido Verde (PV) e do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC) e à recomendação da 4a Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, que trata de assuntos relacionados ao meio ambiente. Ela requer a suspensão imediata da eficácia de 24 dispositivos da Lei de Biossegurança e será analisada pelo ministro Celso de Mello, relator do caso no STF.

Há anos que o influente lobby pela liberação dos transgênicos luta para tirar de seu caminho a pedra da avaliação de riscos à saúde e ao meio ambiente. Conseguiram para isso mudar a lei, mas seus meios escusos parecem estar tropeçando na legalidade, na moralidade e na justiça.

Se for deferida liminar, a suspensão dos pontos questionados será imediata e a Lei virará uma colcha de retalhos, perdendo toda sua parte operacional. Caso o STF não veja urgência em suspender os efeitos da Lei, o julgamento da ADIn correrá seu curso natural no Tribunal, não havendo prazo determinado para julgamento. Mesmo assim, se aceito posteriormente o pedido de inconstitucionalidade, será necessária uma nova lei de biossegurança, já que a atual perderá seu sentido e a anterior, de 1995, não poderá ser resgatada.

Leia mais sobre esse assunto na página do IDEC.

Campanha Por um Brasil Livre de Transgênicos
Boletim Número 258 - 24 de junho de 2005
E-mail: rb.gro.atpsa@socinegsnartedervil

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