Brasil: Sem Terra demonstram força da agricultura camponesa na 15ª Feira da Reforma Agrária

Idioma Portugués
País Brasil

A velocidade e o volume da comercialização demonstraram o déficit que vive a população urbana em relação ao acesso a alimentos saudáveis e sem agrotóxicos. Foram mais de 600 toneladas de produtos comercializados durante a 15ª Feira da Reforma Agrária, que aconteceu entre os dias 10 a 13 de setembro na capital alagoana, em Maceió.

Assentados e acampados de todo o estado puderam mostrar a força da agricultura camponesa ao levaram alimentos saudáveis, artesanatos, discussões sociopolíticas e manifestações culturais à população de Maceió, ao ocuparem por quatro dias a Praça da Faculdade (praça Afrânio Jorge).

A velocidade e o volume da comercialização demonstraram o déficit que vive a população urbana em relação ao acesso a alimentos saudáveis e sem agrotóxicos.


E a realização das feiras da Reforma Agrária em diversos estados tem representado a proposta dos Sem Terra em relação ao modelo de agricultura proposto pelos camponeses para o campo brasileiro.

“Essas feiras é a desvelada e real demonstração da necessidade de um modelo de agricultura que não esteja preocupado com o lucro, a especulação e a destruição dos bens da natureza”, acredita Débora Nunes, da coordenação nacional do MST.

Segundo Débora, o MST fortalece um processo de conscientização de base audacioso no campo, que propõe uma real transição a uma agricultura de matriz agroecológica.

“Por isso, defendemos e insistimos na mudança de matriz produtiva e tecnológica, com uma produção agroecológica que cuide da terra, das águas e principalmente da vida das pessoas. Defendemos e lutamos por um modelo que produza alimentos saudáveis para a sociedade”, afirma.

Segundo dados Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida, cada brasileiro consome em média 5 litros de veneno por ano. Em 2013, o Instituto Nacional do Câncer (INCA) relacionou essas informações com o crescente aumento das ocorrências de câncer na população brasileira.

Para além da capital

Além da Feira na capital Maceió, dezenas de feiras espalhadas pelos municípios também se enchem de produtos vindos das roças de acampados e assentados da Reforma Agrária.

Cada plantio, cada orientação técnica, cada formação da cadeia produtiva e seus processos de comercialização articulam-se numa transição que exige tempo e diálogo formativo.

Nesse sentido Débora explica que o MST tem lutado pela efetivação de uma política nacional de agroecologia para dar sustentação a essa transição de um modelo convencional para o agroecológico, e que ela deve ser sistêmica, e não focal.

Em diversas lutas tem sido pautada a necessidade de dar um olhar especial à atual ameaça representada pelo modelo do agronegócio, com o aprisionamento e envenenamento dos recursos naturais.

“As conseqüências desse modelo atinge todos os alimentos, assim como os derivativos, como pães, farinhas, etc. Isso indica uma violenta perda de soberania alimentar das populações”, observa a Sem Terra.

Ela ainda credita que para além das marchas e negociações com o Estado, é nas feiras que a contraproposta camponesa ganha seu
espaço.

“É na Feira que podemos reafirmar a sociedade a necessidade e o compromisso de seguirmos lutando para que a Reforma Agrária seja realizada como forma de resolver grande parte dos problemas das cidades”, aponta.

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Saúde e Reforma Agrária Popular

Um espaço dedicado exclusivamente ao cuidar da saúde, do bem estar e da troca de saberes populares. Assim foi a Tenda de Educação Popular e Saúde na 15ª Feira da Reforma Agrária.

Logo na entrada da tenda, uma diversidade de ervas fitoterápicas vindas de diversos assentamentos e acampamentos de Alagoas formavam a Farmácia Viva da Feira que dava as boas vindas aos que por ali passavam.

Garrafada, raízes, lambedores e chás também compuseram a entrada da Tenda, que com o verde e aroma inigualável das ervas medicinais, davam o recado que saúde e Reforma Agrária tem tudo a ver.

Em parceria com o Movimento Popular de Saúde, durante todos os dias, feirantes e fregueses passavam para encher as sacolas com esses os produtos, além da possibilidade de participarem de rodas de conversas, degustar chás, e se aproveitar do espaço de cuidados com práticas integrativas de saúde, como reiki, reflexologia e massagem.

Quem passava pela Tenda não saia de lá sem uma indicação de chá ou de garrafada para qualquer problema que estivesse passando.
Seu Antônio, do acampamento São José, no município de Atalaia, era o responsável pela troca de saberes populares em saúde, que com toda a atenção e disponibilidade, ouvia um a um e de imediato dava a indicação do cuidado a partir das plantas.

"A natureza nos dá tudo! A gente só precisa prestar mais atenção nela e deixar de ficar tomando esses remédios de farmácia que muitas vezes faz mais mal pra gente do que bem", afirmou Seu Antônio.

Logo nos primeiros dias, o Setor de Saúde e Gênero do MST lançou a cartilha "Saúde e Reforma Agrária Popular", em que sistematizava os saberes populares em saúde de diversos acampados e assentados de Alagoas.

"A Tenda apresenta a contribuição das áreas de Reforma Agrária no bem viver das pessoas, desde a cultura do campo em saúde, conhecimento popular que acompanhou gerações e gerações", disse Luana Pommé, do setor de educação do MST.

Luana destacou também a relação da Saúde com a Reforma Agrária Popular, "seja na produção de alimentos saudáveis, na preservação da cultura do campo e considerando a saúde em seus diferentes aspectos. Tudo isso está presente no projeto de Reforma Agrária Popular que o MST defende".

Cultura Popular toma a cena

Todas as noites a Feira recebeu diversos nomes da cultura popular. Peça de teatro, folguedos e atrações musicais embalaram todos os dias o Festival de Cultura Popular.

Quem passava para saborear os alimentos também teve a oportunidade de deliciar-se com o melhor da cultura popular.

Todas as noites sanfona, zabumba e triângulo davam o tom da festa com muita animação e arrasta pé, convidando o povo para cair na festa de celebração da fartura do campo.

Do reggae da banda Nação Palmares ao embalo dos Seresteiros de São Vicente, de tudo um pouco passou pelo palco do Festival na 15ª edição da Feira.

O momento foi mesmo de celebração. Para Ariane Sapucaia, estudante universitária, "as noites foram fantásticas, em que trabalhadores e trabalhadoras se reuniram e celebraram juntos com os visitantes da feira. É resultado de muito trabalho e de muita luta".

Ariane ressaltou também a importância do Festival para quem vive na cidade. "O Festival realizado pelo MST foi um momento único na cidade. Com uma diversidade de músicas populares que resgataram nossas raízes e trouxe a história da nossa resistência."

Nesse ano, o destaque do Festival foi a participação dos artistas Sem Terra, que mostraram a arte produzida nas áreas da Reforma Agrária.

Todas as noites a cultura Sem Terra esteve presente no palco, ao mostrar à sociedade maceioense que no campo também se produz cultura.

Crianças, jovens, adultos e idosos. Teve espaço pra todo mundo.

Para José Fernando, conhecido como Tiririca, do setor de cultura do MST, é animador ver os artistas Sem Terra subirem ao palco e mostrarem seu talento. "Chega a ser emocionante ver os nossos cantores e cantoras, que mesmo sem grandes recursos para seus instrumentos, mostram o que sabem fazer e são aplaudidos de pé pelo público que lota a praça central da Feira. Vamos ensaiando entre uma venda e outra e quando subimos no palco é só festa!"

Para Tiririca, além de trazer a alegria para o povo, todas as noites se demonstra “o cuidado que o nosso Movimento tem com a cultura, resgatando a cultura popular nordestina com músicas que retratam nossa história e que tenham a nossa cara."

Edna da Silva, do acampamento José Elenilson, foi uma das artistas Sem Terra que subiram no palco. "Estava ansiosa para essa apresentação. Muitos de nós passamos muito tempo esperando e contando os dias para a chegada da Feira, e para mim esse ano foi mais especial ainda poder subir no palco e cantar para o público aqui presente.”

De dar água na boca...

Especial por Ana Emília

A cultura regional no Nordeste tem sua marca forte na rica diversidade gastronômica, uma culinária que tem traços dos povos que constituíram esse país. Assim sabores com pitadas dos continentes africano ou europeu se misturam com o que os indígenas produziam por aqui.
Para experimentar um pouquinho de tudo isso não precisa ir longe, basta estar no lugar exato e na hora certa. Difícil isso acontecer?! Nada. Há 15 anos o Movimento Sem Terra organiza a Feira da Reforma Agrária na Praça da Faculdade, em Maceió. A feira agrega junto ao processo de comercialização um festival cultural com diversas apresentações que vão desde o folclore com bois, escola de samba e coco a grupos contemporâneos que mesclam a cultura popular com a pauta política

Na feira de tudo tinha um pouco, sabores que iam de uma ponta a outra do estado, assim como musicas e festejos que abrilhantavam essa diversidade.

Tinha buchada? tinha sim senhor. Prato típico do sertão, onde as entranhas do bode são cozidas e dentro do bucho do animal. Uma iguaria de respeito.
Tinha sarapetel? Tinha, sim senhor. Prato típico da região onde as vísceras são cozinhadas e preparadas com o sangue do animal.
Macaxeira, inhame, cuscuz? Oxe, tinha também. E esses daí podiam ser saboreados com carne guisada ou mesmo uma galinha de capoeira. Sabe aquela galinha criada no quintal que tem a carne mais saborosa, com gosto de galinha mesmo, e não de pinto de 39 dias.

Mas se quiser saber mais o que tinha vou fazer uma lista: pamonha para comer com queijo de coalho, ou mesmo o delicioso queijo manteiga. Tapioca com coco e também recheada com queijo e banana. Beiju, pé de moleque (em alguns lugares uns chamam de manauê outros de bimbada), milho cozido, milho assado.... Mas que tal um sururu, essas coisinhas do mar, cozinhados com leite de coco, ou mesmo um peixinho frito com uma batata doce? Falar em doce, também tinha cana caiana bem cortadinha em rolete.
Quer mais? Encontramos os biscoitos de polvilho, bolos, queijadinha, doce de leite, geleia de pimenta feito pelas mulheres que plantam, colhem e beneficiam sua produção.

De bebida era fácil e gostoso encontrar a cachaça temperada com raízes, que servem para alimentar a alma, mas também para curar o corpo.

Para levar pra casa tinha jerimum, ovo de capoeira (daqueles que a gema é cor de gema), peru, galinha, laranja, milho, melancia... seria uma lista longa.
Achou bonito? Ficou com água na boca? Então, agradeça a esse agricultores pela diversidade e fartura. Se fosse pelo agronegócio só estaríamos comendo cana, eucalipto, pinho, soja e milho!
Para além de descrever o que temos, como também referenciar o sabor de cada um desses pratos. O mais importante é saber que essa diversidade é garantida pelos trabalhadores do campo. Do que chega a mesa do trabalhador, esteja ele no campo ou na cidade, cerca 75% é produzido pela agricultura familiar.
São esses agricultores que organizados em movimentos de luta pela terra como MST, CPT, MPA entre outros, cuidam de nossa saúde produzindo alimentos livres de agrotóxicos. São esses trabalhadores e trabalhadoras que fazem o real exercício da democracia quando ocupam os latifúndios exigindo que a riqueza seja distribuída, e nessa terra produzem o alimento nosso de cada dia.

A batalha cotidiana para produzir esses alimentos é parte da luta por reforma agrária. Assim é necessário garantir créditos, condições dignas de vida aos povos do campo, preservar e garantir que a terra, as sementes e água estejam a serviço das futuras gerações, assim como abolir as relações de opressões, exploração e alienação transformando esse mundo em “terra, trabalho e pão”.

Ficou com água na boca ou curioso? Espera ano que vem, no mês de setembro têm mais.

Fuente: MST - Brasil

Temas: Agricultura campesina y prácticas tradicionales, Crisis capitalista / Alternativas de los pueblos

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