Ecuador: Parque Nacional Yasuní: estrada para um problema

Idioma Portugués
País Ecuador

Em fevereiro, cientistas internacionais se mobilizaram para pressionar a Petrobrás a desistir de construir uma estrada dentro do Parque Nacional de Yasuní, na Amazônia equatoriana. A rodovia será aberta no bloco de exploração 31, localizado na parte mais preservada e frágil da reserva

Duas cartas chegaram nos últimos quinze dias à mesa do presidente da Petrobrás, José Eduardo de Barros Dutra. Uma assinada por pesquisadores do Smithsonian Institution, que estuda a biodiversidade do Yasuní há dez anos, e a outra por oito pesquisadores de alta patente no meio acadêmico americano. Entre eles Thomas Lovejoy, inventor do termo biodiversidade. Os dois grupos defendem a mesma teoria: a estrada de 18 km cortará uma parte intocada do Parque e abrirá caminho para caçadores, madeireiros e colonizadores depenarem um dos ecossistemas mais preciosos do planeta.

Yasuní representa apenas 0,1% da floresta amazônica, mas abriga 40% dos mamíferos que vivem nela. Incluindo 10 tipos de primatas e 23 espécies de mamíferos ameaçadas de extinção. A área do parque é de 982 mil hectares e em cada hectare vivem cerca de 100 mil espécies de inseto e 380 de plantas - um dos maiores índices de diversidade de flora do mundo. Especialmente árvores. Segundo os cientistas, esta abundância é fruto de sua localização única, entre os Andes e a Amazônia, bem ali, na linha do Equador.

A previsão é de que as obras da Petrobrás em Yasuní provoquem o desmatamento de pelo menos 140 hectares de floresta primária, mas, como enfatizam os pesquisadores do Smithsonian Institution, “o impacto ambiental gerado pela construção de uma via vai muito além da construção propriamente dita”.

O melhor exemplo está no próprio Parque. Na década de 90, a empresa americana Maxus Energy construiu dentro da reserva uma rodovia de 180 km até os blocos 14 e 16, vizinhos ao 31, adquirido pela Petrobrás em 2002 com a compra da petroleira argentina Perez Companc. O resultado foi desastroso. Os desmatamentos e os assentamentos fugiram do controle, ao ponto de casas serem erguidas ao lado dos oleodutos que cruzam o Parque (foto). A rodovia também incentivou o surgimento de caçadores na região, o que provocou o desaparecimento de algumas espécies. O grande receio é que a história se repita. “Estudos científicos mostram que as estradas são atualmente a maior ameaça às florestas primárias”, alertam os cientistas em uma das cartas.
Apesar da pressão, a Petrobras não cogita desistir da obra. Para a empresa, não há risco da estrada causar os danos previstos pelos cientistas porque ela não será uma via de acesso, mas uma malha de comunicação interna do bloco 31. " A estrada não terá conexão com outras rodovias ou com a parte externa do parque, será usada apenas por funcionários da Petrobras para locomoção entre as insatalações", explicou Milas Evangelista, gerente de segurança, meio ambiente, saúde e qualidade da área de negócios internacionais da companhia. " Quem quiser chegar ao bloco 31 terá que ir de barco ou de helicóptero", enfatizou.

Segundo Milas, a empresa tentou reduzir ao máximo o impacto ambiental da estrada. A via não será asfaltada e terá apenas 5 metros de largura para não dificultar a passagem dos animais. O objetivo é que as copas das árvores formem pontes naturais sobre a pista para os bichos. Aqueles que não sobem em árvore poderão usar túneis subterrâneos previstos na obra.

O projeto é parecido com o adotado na unidade produtiva da Petrobras em Urucu, na Amazônia brasileira. Em fevereiro, representantes de organizações da sociedade civil contrários à presença da Petrobras no Parque Nacional de Yasuní foram visitar a instalação considerada modelo pela empresa. Urucu funciona como uma plataforma no meio da floresta, só se chega de helicóptero. A delegação composta por brasileiros e equatorianos reconheceu que ali há um trabalho bem feito para impedir danos ao meio ambiente, mas mostrou que há diferenças significativas em relação ao Bloco 31. Uma delas é a região do entorno. Perto de Urucu não há comunidades ribeirinhas, enquanto na área a ser explorada no Equador há populações indígenas que nunca tiveram contato com o homem branco.

Diferente de Yasuní, a exploração de Urucu não fica dentro de uma área de reserva. Pela Constituição brasileira, é proibido explorar petróleo em Parques Nacionais. Uma das críticas que pesam sobre a presença da Petrobras no Equador é exatamente a adoção de um duplo padrão “É uma injustiça ambiental transferir o passivo para locais onde a legislação é mais fraca”, afirma Julianna Malerba, da Rede Brasileira de Justiça Ambiental” , que participou em agosto de 2004 de uma missão internacional ao Yasuní para investigar os impactos das atividades petroleiras no Parque.

A carta dos pesquisadores do Smithsonian Institution ao presidente da Petrobras termina com a recomendação de que a empresa adote uma política de exploração no Bloco 31 que tenha como objetivo “manter a integridade biológica e ambiental da área”. Algo compatível com o que a Petrobras diz ser o seu compromisso.

A primeira manifestação de acadêmicos contra a construção da estrada aconteceu em novembro do ano passado, quando 59 pesquisadores de dez países enviaram uma carta aos presidentes do Equador, do Brasil e da Petrobrás recomendando que a obra fosse suspensa. Em janeiro deste ano, a Associação para a Biologia e a Conservação Tropical, maior organização científica dedicada ao estudo e à conservação dos ecossistemas tropicais, também pediu para o governo equatoriano vetar o projeto.

A Petrobras já começou a construir um porto no bloco de Yasuní, mas não a estrada. Em abril, a empresa deve realizar uma nova rodada de diálogo com a sociedade civil. Desta vez no Equador.

Leia na íntegra a carta enviada pelo Smithsonian Institute.

Leia na íntegra a carta enviada pelos pesquisadores.

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