Brasil: transgênicos: ONGs exigem estudo de impacto ambiental

Para entidades, cientistas da CTNBio não têm isenção para analisar questão

A decisão da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) de liberar a soja transgênica no Brasil, em 1998, foi irresponsável, com base em certezas científicas inexistentes. Essa é a posição da Campanha por Um Brasil Livre de Transgênicos, associação que reúne mais de 80 organizações não-governamentais (ONGs), entre elas a Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa (ASPTA), o Movimento dos Sem-Terra (MST), Greenpeace e Instituto de Defesa do Consumidor (Idec). A coordenação da campanha enviou uma carta ao Estado para responder às críticas do pesquisador Luiz Antonio Barreto de Castro, presidente da CTNBio quando a soja foi liberada, às táticas usadas por opositores da biotecnologia. Veja trechos da carta:

?Nosso objetivo é evitar que se consuma no Brasil uma farra dos transgênicos sem que a comunidade científica tenha sequer definido critérios mínimos para elaboração de normas de biossegurança. Afinal, como sabem os cientistas responsáveis, ausência de prova de impacto não significa prova de ausência de impacto. (...)

Sempre defendemos que o Brasil realize mais e mais pesquisas sobre os OGMs, ao contrário da Monsanto, que se recusa a fazer Estudo de Impacto Ambiental (EIA) de sua soja, apesar de há anos ter em mãos estudo elaborado pelo ex-presidente do Ibama, Eduardo Martins, contratado da empresa, com os critérios mínimos necessários para tal EIA. Não há melhor prova do que esta recusa de que há ?algo de podre? no reino dos transgênicos.

Concordamos com a Embrapa em sua posição diante dos transgênicos: ?A Embrapa está consciente de que praticamente inexistem pesquisas conclusivas sobre os riscos para a saúde dos consumidores que venham a ingerir alimentos geneticamente modificados, bem como de que não há ainda no País pesquisas conclusivas sobre os riscos decorrentes da liberação de OGMs no meio ambiente, o que deve ser estudado caso a caso?, conforme documento da empresa amplamente divulgado em 2 de setembro. (...)

Os transgênicos até agora comercializados são um fiasco agronômico e econômico e um problema de mercado para quem os produz, conforme reconhecem dois pesquisadores americanos do Serviço de Pesquisa Econômica do Departamento de Agricultura (USDA), Fernandez-Cornejo e D. McBride, publicados no relatório de economia agrícola (AER810, de maio 2002): ?Talvez a maior questão levantada por esses resultados (da pesquisa) é o como explicar a rápida adoção dos cultivos transgênicos quando os impactos financeiros nas fazendas parecem ser contraditórios e até negativos.?

E por falar nos EUA, é necessário observar que a liberação naquele país dos transgênicos em 1992 resultou de uma decisão política do governo de George Bush, pai. Ele dobrou cientistas do Food and Drug Administration (FDA) que alertavam: eram necessárias mais pesquisas de avaliação de riscos. Os pesquisadores foram calados por decisão hierárquica na FDA e suas posições só foram conhecidas porque uma ONG americana de defesa dos consumidores exigiu na Justiça a divulgação dos documentos do debate interno (...). Para enquadrar a FDA, Bush, pai nomeou um advogado do escritório de defesa dos interesses da Monsanto para a direção do órgão.

No caso do Brasil, chega a ser aberrante a composição da CTNBio, criada no governo anterior, com o objetivo de avaliar a segurança de OGMs. Em sua maioria, os integrantes da comissão primam por uma defesa intransigente da liberação dos transgênicos e por um ataque obstinado a todos os que apontaram para a necessidade de estudos prévios de impacto sobre o ambiente e a saúde dos consumidores. São especialistas em engenharia genética com interesses nesta liberação e deveriam ser impedidos de decidir em causa própria. (...)

Infelizmente, o governo Lula não entendeu a gravidade da decisão que está por tomar. Este debate apressado e pressionado pelo lobby da Monsanto é uma temeridade. Mais ainda por tratar-se de um debate a portas fechadas em que o público não interfere e sequer sabe as possíveis conseqüências das decisões que podem ser tomadas.?

O Estado de São Paulo, Brasil, 12-9-03

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