Conhecimentos tradicionais ganham estratégia contra biopirataria

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A campanha “O Cupuaçu é Nosso”, que batalhou para alterar os pedidos de patentes da fruta brasileira feitos no exterior, não é nova

Mas a vitória ampliou a causa, antes restrita à questão inicial da fruta típica do Norte, de forma a chamar a atenção para um problema maior de pedidos de patentes sobre diversas outras espécies vegetais. Durante a 8ª Conferência das Partes da Convenção de Diversidade Biológica (COP-8/CDB), Michael Schimidlehner, presidente da ONG Amazonlink, idealizadora da campanha, defendeu um maior controle da apropriação indevida de recursos biológicos que, a exemplo do cupuaçu, são alvo de patentes no exterior, mesmo sem ser produtos inovadores.

A campanha sensibilizou o Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI) a publicar uma lista contendo nomes de frutas da Amazônia que deverá ser consultada por outros órgãos de registro de marcas antes de eles aprovarem um produto. No entanto, a medida não impede que em outros países isso venha a ocorrer. A sugestão dada por Schimidlehner é de que o trabalho de proteção intelectual seja previsto e implementado pela CDB e por acordos internacionais no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC).

Hoje, para se obter uma patente, o pedido precisa preencher três requisitos: ter uma aplicabilidade industrial, ser uma novidade e envolver um processo criativo. “Seria importante também incluir outros requisitos como, por exemplo, a comprovação de origem; facilitando, assim, mostrar a existência de conhecimento tradicional”, afirmou.

Um dos frutos da campanha é o projeto Aldeias Vigilantes, que pretende capacitar comunidades indígenas, por meio de informação, educação e conscientização, para que sejam os guardiões de seu conhecimento e recursos em caso apropriação desautorizada de conhecimentos tradicionais e recursos biológicos da Amazônia. As denúncias deverão circular rapidamente, por meio de uma rede de informações formada entre os núcleos de apoio que serão montados, neste primeiro momento, no estado do Acre, em parceria com a Fundação Nacional do Índio (Funai) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Os núcleos então deverão acionar o Ministério Público e a Polícia Federal. “Sentimos que não podemos mais ficar correndo atrás de cancelamento de registros já concretizados, mas temos que fazer um trabalho pró-ativo de prevenção na fonte, nas comunidades indígenas”, defendeu o presidente da ONG.

O projeto Aldeias Vigilantes partiu de uma iniciativa do Amazonlink e dos povos indígenas Katukina, Manchineri, Yawanawá e Kaxinawá, e conta com o financiamento do governo federal, por meio Departamento do Patrimônio Genético do Ministério do Meio Ambiente.

“Na medida em que não respeitamos o conhecimento tradicional, enfraquecemos as comunidades, e a biodiversidade também será prejudicada”, disse o presidente da Amazonlink. Ele lembrou que está é uma questão em discussão na CDB, por meio da COP-8, no entanto, afirma que, embora a Convenção exista há 14 anos, “ainda não surtiu muitos efeitos”, no que diz respeito à repartição de benefícios. “O importante seria que este regime estivesse vinculado à CDB, porque obrigaria os países membros a cumprirem o acordo, ficando sujeitos a multas em caso de não cumprimento”, sugeriu Schimidlehner.

Hoje, participam das discussões das reuniões da COP todas as camadas da sociedade, incluindo as ONGs, povos indígenas, indústrias, comunidade científica e autoridades governamentais. No entanto, são poucos os que têm direito a voto. “Esta participação ainda deve ser aumentada significativamente”, conclui.

Com Ciência, Internet, 23-3-06

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