Brasil: MST comemora 20 anos

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra está em festa. São 20 anos de luta pela Reforma Agrária e pela busca de igualdade e justiça social

Luta, dignidade e conquista marcam a história de resistência do maior movimento social da América Latina

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra - Brasil

Portuguese
(En Español más abajo)

Trabalhadores rurais de 23 estados brasileiros estão reunidos em São Miguel do Iguaçu, no Paraná por ocasião do XII Encontro Nacional do MST, que teve início no dia 19 e segue até 24. O encontro está sendo realizado no assentamento Antônio Tavares, ex-fazenda do extinto Banco Bamerindus. Este período marca o aniversário do Movimento que teve sua fundação em Cascavel, no Paraná, em 1984. Cerca de 1200 pessoas, entre militantes e colaboradores do Movimento, avaliam a luta pela Reforma Agrária e os desafios que se apresentam na atual conjuntura.

Na cerimônia de abertura uma celebração relembrou a dura história da luta pela terra de milhares de sem terra no decorrer dos 20 anos. Lideranças históricas do Movimento e representantes de entidades nacionais e internacionais reafirmaram os princípios e objetivos da luta do povo, além de homenagear os lutadores e organizações dos quais o MST é fruto.

O evento contou com a presença de personalidades como Anita Freire, viúva do pedagogo Paulo Freire, um dos maiores colaboradores e defensores na construção do MST; Elizabete Teixeira, dirigente das Ligas Camponesas, hoje com 79 anos, reprensentou as lutas que antecederam o Movimento; bispo D. Orlando Dotti, da CPT; o belga Dirk Habib, representando os comitês de apoio internacional; Luiz Marinho, da CUT; Maurício de Andrade, da Ação Cidadania; Luiza Kurrín, da Via Campesina Internacional; representante da Pastoral Luterana e UNE; Nalú Faria, da Marcha das Mulheres e João Pedro Stédile, da Coordenação Nacional do MST. Na ocasião todos reforçaram a solidariedade e o apoio à luta dos trabalhadores rurais.

Durante o discurso de abertura, João Pedro Stedile, enfatizou que só se faz Reforma Agrária por meio da luta coletiva e de massa, ?a única coisa que pode mudar a sociedade é povo organizado.

Ele mostrou que no início os trabalhadores achavam que bastava conquistar a terra. Depois perceberam que existem outras cercas no caminho. ?Não basta derrubar as cercas e conquistar a terra. É preciso derrubar as da ignorância, do capital e, de dois anos para cá, descobrimos que é preciso também derrubar mais uma cerca: a da tecnologia das multinacionais que nos impõe as sementes transgêncicas. Se perdemos o patrimônio das sementes, de nada adiantará conquistarmos a terra e o capital. Aqui no Brasil, o camponês tem que lutar contra os transgênicos, nem que tenhamos que ir à guerra.?

Para finalizar, Stedile reforçou que o Encontro deve servir para compreender o momento político atual e afirmou que o MST está diante de desafios muito maiores, sendo preciso ajustar, cada vez mais, as lutas do Movimento com a agenda de outros setores da sociedade.

A história do assentamento onde está sendo realizado o Encontro acentua mais a simbologia da evolução do Movimento. A área de 1098 hectares era uma antiga propriedade que pertencia ao dono do Banco Bamerindus e que foi ocupada pelo MST para evitar que a fazenda entrasse com preço sobrevalorizado como parte do pagamento da dívida do banco à União, quando este faliu em 1997.

A desapropriação só veio definitivamente em 2002, quando o Banco Central transferiu a fazenda para o Incra, disponibilizando a terra para a Reforma Agrária. Idelmar Gonçalves da Silva, morador do Assentamento, comemora a desapropriação da fazenda. ?O assentamento é uma conquista e uma referência para quem nos apoiou, ainda mais depois de oito anos de governo Jaime Lerner, quando os sem terra eram liquidados?.

Para João Paulo Rodrigues, da coordenação nacional do MST, o retorno à região sudoeste do Paraná, tem uma carga simbólica muito forte. ?Retornar a esse local após 20 anos simboliza conquistas da luta pela terra. Para se ter uma idéia, hoje, nos nossos quase cinco mil assentamentos nenhuma criança passa fome. Poder completar 20 anos aqui nos anima para a lutar por mais 100?, comemora Rodrigues.

História

Em 1984 um grupo de 80 representantes de organizações camponesas de 13 estados brasileiros se reuniram em um igreja próxima à cidade paranaense de Cascavel entre os dias 20 e 24 de janeiro. Nessa reunião foi decidida a criação de um movimento nacional que reunisse os camponeses que desde o fim dos anos 70 vinham se organizando para reivindicar o acesso à terra que lhes havia sido tirada pelo processo de mecanização que vinha transformando a agricultura brasileira ao longo da última década. Esses camponeses, que já vinham sendo chamados de ?sem terra? pela imprensa decidiram incorporar a expressão ao nome do movimento e assim fundaram o MST. Hoje, o Movimento conta com cerca de 350 mil famílias assentadas e aproximadamente 150 mil vivem em acampamentos. Considerando que a média da família brasileira é de quatro pessoas, os militantes do MST chegam quase dois milhões de pessoas.

Geração de trabalho e renda com a Reforma Agrária

?Os números mostram que a Reforma Agrária é uma solução para o desemprego no Brasil?, afirma Ariovaldo Umbelino, professor da USP e doutor em Geografia. Para ele ?o cumprimento da meta estabelecida pelo presidente Lula no segundo Plano Nacional de Reforma Agrária (PNRA) de assentar 500 mil famílias até o final de 2006 poderá gerar 2,5 milhões de empregos no campo. De acordo com dados do IBGE o custo para se gerar um emprego numa indústria automotiva é de 50 mil dólares e o custo para a geração de um posto de trabalho no campo é de 1500 dólares. Além disso, ainda segundo o IBGE, a Reforma Agrária elevaria a renda do trabalhador rural, que hoje vive com menos de um salário mínimo para três salários mínimos?.

Além dessas vantagens, o professor Umbelino lembra ainda que a pequena propriedade (até 200 ha) é responsável por mais de 70% dos suínos, aves, leite, ovos, cacau, banana, feijão, mandioca de toda a produção nacional. ?As pequenas propriedades respondem por 35% da produção nacional mesmo da soja ? que é o primeiro produto da pauta de exportação no Brasil.? Enquanto isso, dados do IBGE apontam a improdutividade das grandes propriedades (com mais de 2 mil ha). O latifúndio produz apenas 22% da carne bovina, 9% dos ovinos, 2%dos suínos, 1% das aves, 15% do algodão, 33% da cana-de-açucar, 22% da soja, 2% do café, 11%do cacau, 5%do feijão e 1% da mandioca. Umbelino ressalta a importância da renda gerada nas pequenas propriedades. ?Do total da renda gerada por toda a agropecuária brasileira, 56% é gerada na pequena propriedade, 30% na média e apenas 14% na grande.?

No MST existem mais de 500 associações de produção, comercialização e serviços; 49 Cooperativas de Produção Agropecuária (CPA), com 2299 famílias associadas; 32 Cooperativas de Prestação de Serviços com 11174 sócios diretos; duas Cooperativas Regionais de Comercialização e três Cooperativas de Crédito com 6521 associados.

São 96 pequenas e médias agroindústrias que processam frutas, hortaliças, leite e derivados, grãos, café, carnes e doces, além de diversos artesanatos. Tais empreendimenos econômicos do MST geram emprego, renda e impostos beneficiando indiretamente cerca de 700 pequenos municípios do interior do Brasil.

Educação

Aliada à produção está a educação: cerca de 160 mil crianças estudam no Ensino Fundamental nas 1800 escolas públicas dos acampamentos e assentamentos. São cerca de 5 mil educadoras/es pagos pelos municípios ou estados que desenvolvem uma pedagogia específica para as escolas do campo. O setor de educação atua ainda na educação infantil (de 0 a 6 anos), contando hoje com aproximadamente 500 educadores/as. O MST desenvolve um programa de alfabetização de aproximadamente 30 mil jovens e adultos nos assentamentos e acampamentos. Para desenvolver todo esse trabalho o MST conta com o apoio do Pronera (Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária), do INCRA/MDA e do Programa Brasil Alfabetizado, do MEC. Além desses, o Movimento é apoiado pela Unesco, Unicef e por mais de 50 universidades.

Atualmente existem 1500 estudantes do MST em cursos de ensino médio e superior. Há também a formação de técnicos em administração de assentamentos, cooperativas e em magistério para colaborar com o trabalho desenvolvido nos assentamentos através do Instituto de Educação Josué de Castro, e Veranópolis (RS). 750 militantes do MST estudam em cursos universitários. Desses, 58 cursam medicina em Cuba.
____________________________________________________

Español

Los Sin Tierra conmemoran 20 años

El Movimiento de los Trabajadores Rurales Sin Tierra (MST) está de fiesta. Son 20 años de lucha por la reforma agraria y por la búsqueda de igualdad y justicia social. Trabajadores rurales de 23 estados brasileños se reúnen en São Miguel do Iguaçu, en Paraná, del 19 al 24 de enero, con ocasión del XII Encuentro Nacional del MST que marca el aniversario del Movimiento cuya fundación tuvo lugar en Cascabel, Paraná, en 1984.

En la ceremonia de apertura se recordó la dura historia de lucha por la tierra de millares de sin tierra en el transcurso de los 20 años. Líderes históricos del movimiento y representantes de entidades nacionales e internacionales reafirmaron los principios y objetivos de la lucha del pueblo, y además se rindió homenaje a los luchadores y organizaciones que forjaron el MST.

Durante su intervención, João Pedro Stedile, de la Coordinación Nacional del MST, destacó que solo se hace reforma agraria por medio de la lucha colectiva y de masa, pues la "única cosa que puede cambiar la sociedad es el pueblo organizado". En la trayectoria del movimiento, señaló, al inicio los trabajadores encontraban que bastaba conquistar la tierra; después percibieron que existen otras cercas en el camino. "No basta derrumbar las cercas y conquistar la tierra. Es preciso derrumbar las de la ignorancia, del capital y, desde hace dos años, descubrimos que es preciso también derrumbar una cerca más: la de la tecnología de las multinacionales que nos impone las semillas transgénicas. Si perdemos el patrimonio de las semillas, de nada servirá que conquistemos la tierra y el capital. Aquí en Brasil, el campesino tiene que luchar contra los transgénicos, aunque tengamos que ir a la guerra", acotó Stedile.

En 1984 un grupo de 80 representantes de organizaciones campesinas de 13 estados brasileños se reunieron en una iglesia próxima de la ciudad de Cascabel entre el 20 y 24 de enero. En esta reunión se acordó la creación de un movimiento nacional que congregase a los campesinos que desde finales de los años 70 se venían organizando para reivindicar el acceso a la tierra que les había sido retirada por el proceso de mecanización que estaba produciendo una transformación de la agricultura brasileña. Esos campesinos, que estaban siendo llamados "sin tierra" por la prensa nacional, decidieron incorporar la expresión al nombre del movimiento y así fundaron el MST. Hoy, después de 20 años, el Movimiento cuenta con cerca de 350 mil familias asentadas y, aproximadamente, 150 mil viven en acampamentos. Considerando que el promedio de la familia brasileña es de cuatro personas, los militantes del MST llegan alrededor de dos millones de personas.

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra - Brasil

Comentarios