Brasil: CTNBio se reúne hoje sob tensão entre conselho e ambientalistas

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País Brasil

Greenpeace considera que faltam transparência e imparcialidade científica aos trabalhos da comissão

A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) reúne-se hoje em Brasília sob clima inédito de disputa e tensão.

O encontro - o primeiro depois da confusa reunião de março - ocorre um dia depois de a Advocacia-Geral da União (AGU) ter perdido a batalha na Justiça para reduzir os poderes da procuradora regional da República Maria Soares Cordioli na CTNBio.

O juiz da 4ª Vara da Justiça Federal, Naiber Pontes de Almeida, negou pedido de liminar para que Maria tivesse sua atuação limitada como ouvinte, o que seria uma espécie de retaliação a sua participação na reunião de março.

No mês passado, integrantes do Greenpeace tentaram participar como ouvintes da sessão e contaram com o auxílio da procuradora para entrar no encontro.

Depois de ingressar na sala, eles se recusaram a sair para que os membros da comissão pudessem votar sobre a sua permanência ou não no encontro.

A procuradora, por sua vez, afirmara na época que houve abuso de autoridade e que a sessão deveria ser pública.

A notícia da recusa da liminar serviu para reduzir o ânimo de parte dos integrantes da CTNBio, contrários à presença da procuradora nas reuniões.

Resta ver qual será o reflexo da medida no clima da reunião de hoje, marcada para ser realizada no prédio do Ministério da C&T, por motivo de segurança.

Três representantes do Greenpeace fizeram novamente pedido para participar do encontro de hoje, que tem na pauta a liberação comercial de uma espécie de milho transgênico desenvolvido pela Bayer.

Integrantes do ministério afirmaram que, se for preciso, a Polícia Federal poderá ser chamada.

O pedido de participação dos integrantes do Greenpeace deverá ser submetido pelo presidente da CTNBio, Walter Colli, a apreciação de integrantes do conselho.

“Só vou permitir o ingresso caso tal pedido seja aceito pelos conselheiros”, afirmou Colli, horas depois de receber, formalmente, uma recomendação da procuradora da República no Distrito Federal, Ana Paula Mantovani, de abrir todas as sessões da CTNBio para garantir o princípio da publicidade.

“Vou agir conforme o entendimento da consultoria jurídica do Ministério”, afirmou Colli.

Ele argumentou que a publicidade das reuniões é garantida com a publicação da pauta e da ata das reuniões no Diário Oficial e no site da CTNBio.

A CTNBio tem um prazo de cinco dias para informar ao Ministério Público Federal as medidas que serão adotadas para dar efetivo cumprimento à recomendação.

Caso contrário, o MPF pode entrar com uma ação na Justiça para garantir a publicidade das sessões. Eventuais abusos de autoridade cometidos pelo presidente Walter Colli na última sessão serão investigados.

Oposição

O Greenpeace pretende entregar hoje, durante a votação da CTNBio, uma homenagem ao que a ONG está chamando de 'Homem do Ano' – um político não-identificado que estaria ajudando as empresas de biotecnologia Syngenta, Monsanto e Bayer a conseguir a liberação do milho transgênico. A brincadeira faz parte das ações da entidade contra a votação da comissão.

Na semana passada, a ONG entregou uma carta ao ministro da Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende, apresentando suas objeções ao cultivo do milho Bt no Brasil e ao desempenho da própria CTNBio.

Os ambientalistas consideram que faltam 'transparência e imparcialidade científica' aos trabalhos da comissão.

“Apesar de ter sido criada em 1996 e reformulada em 2005, a CTNBio até hoje não definiu procedimentos para avaliar a documentação apresentada pelas empresas ou instituições. As que solicitam liberação comercial de organismos geneticamente modificados apresentam, voluntariamente, documentos e estudos realizados, na maior parte dos casos, por elas mesmas”, escreveram Gabriela Vuolo, coordenadora de campanha de engenharia genética, e Frank Guggenheim, diretor-executivo da entidade.

Sem revisão desses aspectos, acreditam os ambientalistas, fica impossível julgar o risco da plantação do milho transgênico.

“Se a comissão aprovar hoje, o país jogará o compromisso de biossegurança no lixo. O órgão que assumiu o compromisso liberará um produto sem regras claras nem transparência”, diz Marcelo Furtado, diretor de campanhas da ONG.

Na carta, a entidade reivindica a substituição de Colli e uma ação do ministério junto à CTNBio para assegurar a imparcialidade científica das discussões e decisões.

Os ambientalistas pedem que todos os membros da comissão entreguem imediatamente suas declarações de conflito de interesses. “Há gente lá trabalhando para empresas, não pode”, diz Furtado.

(Colaborou Giovana Girardi)

Walter Colli pode sofrer ação

A procuradora da República no Distrito Federal, Ana Paula Mantovani, afirmou que o presidente da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), Walter Colli, corre o risco de sofrer uma ação por improbidade administrativa caso não permita que as sessões sejam abertas ao público.

“O princípio da publicidade é cumprido por todos. Veja as sessões do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente), do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica). Por que seria diferente com a CTNBio?”, questionou Ana Paula.

A procuradora observou que não basta que decisões sejam depois publicadas no Diário Oficial para satisfazer o princípio constitucional da publicidade.

O presidente da CTNBio, Walter Colli, porém, não vai cumprir imediatamente a medida. Ele afirmou que a entrada dos representantes da entidade como ouvintes somente seria autorizada depois de integrantes do conselho votarem a favor sobre o assunto.

“Este é um órgão democrático”, justificou Colli.

A procuradoria deu um prazo de cinco dias para que a CTNBio informe qual atitude tomou depois da audiência de ontem. “Ele está informado sobre nossa avaliação”, disse.

“O presidente da CTNBio afirma que conselheiros podem ficar constrangidos. Mas isso não é argumento. E o que diz o juiz, ao dar a sentença para um acusado? Se intimidação fosse argumento, não haveria julgamento a portas abertas.”

Lígia Formenti escreve para “O Estado de São Paulo”

Jornal da Ciencia, Internet, 18-4-07

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