Brasil: planos de Lula para integrar continente preocupam ONGs

Idioma Portugués
País Brasil

Sigla relativamente desconhecida no Brasil, a IIrsa, um ambicioso projeto de integração latino-americana que prevê 22 grandes obras de infra-estrutura envolvendo 12 países, é um novo foco de críticas de ONGs contrárias à política ambiental do governo de Luiz Inácio Lula da Silva

Enquanto o PPA (Plano Plurianual) é uma ficção orçamentária, cuja execução o próprio governo já admite rever, obras ecologicamente polêmicas assumidas como prioridades na Iirsa, como a hidrovia Paraguai-Paraná e o complexo de hidrelétricas e eclusas do rio Madeira em Rondônia, são abertamente defendidas por integrantes do primeiro escalão do governo, como o presidente do BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social), Carlos Lessa, e o assessor especial de Lula para assuntos internacionais, Marco Aurélio Garcia.

"Coerentemente, aqueles que querem preservar o meio ambiente como absoluto deviam ser consequentes e propor o genocídio. Por quê? Porque a única forma de ter um meio ambiente amável, bem tratado, bem cuidado, preservado e sustentável é dando uma condição de vida digna para todas as pessoas, para o bicho homem, que faz parte da natureza. Eu não resisto muito a sublinhar isso, porque é evidente que uma estrada que está encascalhada deve ser asfaltada, ou então dinamitada, e devem ser colocadas trincheiras, com minas, para destruir qualquer bicho homem que ouse penetrar naquele espaço", declarou Lessa no encerramento do seminário que marcou o comprometimento do governo Lula com a Iirsa, de 5 a 8 de agosto último, na sede do banco, no Rio de Janeiro.

"Pelo que eu estive conversando, praticamente todos os 22 projetos já têm as autorizações de meio ambiente, as avaliações de impacto ambiental. Vamos estar prontos para seguir em frente", adiantou Lessa, que comparou algumas obras à "conquista do Velho Oeste americano".

Amanhã, em Brasília, 40 ONGs (Organizações Não Governamentais) estarão reunidas para debater a Iirsa (Integração da Infra-estrutura Regional da América do Sul) e estudar providências contra as obras mais polêmicas.

"O próprio discurso de Lula sobre a Amazônia traz, na essência, o que diz o presidente do BNDES. A idéia de que a Amazônia deve ser "ocupada", ter seus "vazios preenchidos", nos remete ao regime militar. Nós precisamos de outras lógicas", disse o biólogo Alcides Faria, 50, secretário-geral da Rios Vivos, uma coalizão de 400 ONGs da América do Sul, Europa e Estados Unidos, incluindo a Fundação SOS Mata Atlântica e a Amigos da Terra, que organiza o debate de amanhã em Brasília.

Em sua participação no seminário do Rio, Marco Aurélio Garcia confirmou o empenho de Lula para que as obras do Iirsa saiam do papel. "O presidente Lula deposita grande esperança e expectativa em relação a esse evento", disse Garcia, situando o encontro como chave para a estratégia política de Lula para o continente. Ele relacionou a integração física latino-americana ao próprio sucesso da região das negociações na Alca (Área de Livre Comércio das Américas) e na União Européia: "Todos esses cenários [negociações] terão desfechos de um ou de outro tipo, dependendo da nossa capacidade de unidade".

O ministro interino do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Márcio Fortes de Almeida, foi mais direto: "Quero alertar: nas negociações da Alca um dos itens que mais é discutido pelos norte-americanos é o acesso a serviços de engenharia, algo que estamos discutindo nessa mesa aqui.

Ou nos unimos todos e vamos desenvolver nossas empresas, nossas grandes construtoras, ou pela negociação da Alca daqui a pouco veremos que outros estarão fazendo essas coisas".

Os projetos da Iirsa estão sendo analisados por BNDES, BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), CAF (Corporação Andina de Fomento) --uma espécie de banco de desenvolvimento do bloco andino cujo caixa é formado por 16 países, incluindo o Brasil-- e Fonplata (Fundo Financeiro para Desenvolvimento da Bacia do Prata). Não há número fechado sobre o custo total dessas obras. O complexo do rio Madeira custaria US$ 5,5 bilhões somente no trecho brasileiro. O projeto da hidrovia Paraguai-Paraná prevê US$ 80 milhões iniciais. Também não foi divulgado o valor que o BNDES pretende investir em cada obra.

A criação formal da Iirsa data de setembro de 2000, num encontro de presidentes de 12 países latino-americanos ocorrido em Brasília e presidido por Fernando Henrique Cardoso. O projeto todo prevê 12 eixos de integração. Com o governo Lula, "CAF/BNDES nunca antes haviam trabalhado tão intensamente", segundo o vice-presidente corporativo da CAF, Antonio Juan Sosa.

Rios Vivos, Internet, 30-8-05

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