Cobrindo o Amazonas com soja

Idioma Portugués
País Brasil

Banco Mundial aceita fazer uma auditoria do empréstimo à Maggi. Governador do Mato Grosso usa recursos internacionais para expanbdir soja na amazonia

Pode-se dizer que o grande estado do Mato Grosso, no Centro do Brasil, é um paraíso, pelo menos a distância. A rica Floresta Amazônica, chamada dos "pulmões do mundo", se espalha pelo estado, bem como o cerrado. Papagaios, onças, são apenas alguns dentre a abundância de espécies que se encontram no cerrado, considerado um dos habitats mais ricos em bio-diversidade do mundo, juntamente com espécies ameaçadas como o lobo-guará, tamanduá e a foca gigante dos rios.

A paisagem do Mato Grosso, entretanto, está sendo alterada rapidamente com os vastos campos de soja e fazendas de gado que tomam o lugar das matas. A soja manda no Mato Grosso e não é apenas a soja que a maior parte do mundo associa com a ecologicamente correta dieta vegetariana.

Com o alerta causado pela epidemia da Vaca Loca, os produtores de soja se beneficiaram de uma demanda aumentada no países afluentes por carne de gado alimentado com ração a base de soja, ao invés de ração a base de restos animais. Esse é apenas um dos últimos fatores que permitiram que o Grupo André Maggi conduzisse, juntamente com o governo brasileiro, a expansão da soja no Mato Grosso e estados adjacentes por mais de duas décadas, com conseqüências perturbadoras.

"A soja nesse momento é a mais importante força para o desmatamento, direta ou indiretamente," diz o analista Jan Maarten Dros. "Diretamente por que o cerrado esta tendo a sua vegetação natural convertida em campos de soja. Mas indiretamente, por que nessas regiões muitas fazendas de gado estão sendo transformadas em fazendas de soja, compradas ou alugadas,." Isso significa, segundo um estudo do Dros de 2003 da WWF sobre os impactos do cultivo da soja no Brasil, que os "pecuaristas tendem a avançar floresta adentro, causando mais desmatamento."

O Governador do estado do Mato Grosso é Blairo Maggi, o dono do grupo Maggi, que é também conhecido com o rei da soja. Na verdade, o grupo Maggi é o maior produtor privado de soja do mundo. A empresa teve $600 milhões de dólares de vendas esse ano, unicamente administrando a produção, comércio e processamento de 2 milhões de toneladas de soja, que em sua maior parte é destinada a alimentar animais na Europa e Ásia. Maggi também teve um papel chave em estabelecer a infra-estrutura de transporte que abre ainda mais o Amazonas para o desenvolvimento e o desmatamento.

Em 2003, o primeiro ano de Maggi como governador do estado, o ritmo do desmatamento em Mato Grosso mais do que dobrou. O ano passado quando o jornal New York Times evidenciou que a destruição da Floresta Amazônica tinha aumento para dois quintos da mata original, Blairo Maggi respondeu que: "para mim, 40 por sento de aumento no desmatamento não significa nada, não sinto a menor culpa pelo que estamos fazendo aqui. Nós estamos falando de uma área maior do que a Europa que nem sequer foi tocada, portanto não há nada para se preocupar."

Apesar do ecosistema frágil na qual opera e a controvérsia ao redor das suas práticas, o agro negócio brasileiro não teve nenhum trabalho em conseguir uma fortuna em empréstimos de bancos privados na Europa e no Japão, e de instituições públicas como A Corporação Financeira Internacional [ International Finance Corporation] (IFC), o setor de empréstimos privados do Banco Mundial. Em 2002 a divisão de produção de soja do grupo Maggi, Amaggi Exportação e Importação Limitada, obteve dois empréstimos back to back [empréstimo entre um banco estrangeiro e um cliente estrangeiro] consecutivos de $30 milhões de dólares do IFC um em 2002 e o segundo foi concedido em setembro de 2004.

O Banco Mundial faz auditoria do empréstimo ao Amaggi

O grupo Maggi, entretanto encontrou uma pedra no caminho. Sob pressão de ONGs no Brasil e do exterior, o presidente do Banco Mundial, James Wolfensohn exigiu uma auditoria pelo escritório do Ombudsman sobre o empréstimo de 2004 para a Amaggi, declarando em uma carta à uma ONG brasileira que "a auditoria irá nos oferecer uma revisão independente da questão e os resultados serão trazidos a público."

Para ambos os empréstimos, o IFC designou para o projeto a avaliação social e ambiental na Categoria B, o que significa que "pode resultar um impacto ambiental e/ou social limitado, que pode ser evitado e atenuado," segundo Rachel Kyte, diretora do Departamento de desenvolvimento Social e do meio-ambiente, essa classificação pode ser revista agora

"Se os argumentos da sociedade civil tivessem sido considerados a dois meses atrás," diz Roberto Smeraldi, diretor do Friends of the Earth Amazonia, em resposta, "essa auditoria não seria necessária". ONGs brasileiras e estrangeiras argumentam que o empréstimo deveria ter concedido a Categoria A de classificação, definida como "possibilidade de causar impactos adversos significativos que são sensíveis, diversos e sem precedentes." Tal categorização iria sinalizar o potencial do projeto para causar sérios danos ao frágil eco-sistema do cerrado.

O empréstimo do IFC oferece condições de capital para a Amaggi expandir a sua capacidade de armazenagem da soja ao mesmo tempo em que simultaneamente oferece pré-financiamento aos 900 médios agricultores de soja nos estados de Mato Grosso e Rondônia dos quais a Amaggi compra a maior parte da soja. Esses rendatários tendem a ter capital limitado e portanto tem que se voltar para o Amaggi para financiamento, já que o governo brasileiro somente oferece empréstimos á um juro elevado. Em contrapartida, os fazendeiros assinam contratos para vender o seu produto a Amaggi segundo os termos da empresa de agro negócio.

O problema com esse acordo, diz a geógrafa Wendy Jepson, cujo trabalho se concentra na produção de soja nos estados de Mato Grosso e Rondônia, é que os empréstimos de pré-financiamento oferecidos pela Amaggi não apresentam condições detalhadas sobre o meio ambiente e prendem os fazendeiros em acordos com a Amaggi. "O empréstimo do IFC está direcionado de maneira errada por que não estipula nenhuma condição ambiental para condições de cultivo usadas pelos produtores para a soja. Está facilitando a expansão da produção e não está lidando com o fato de que estes agricultores tem pouca escolha na maneira como irão produzir.

Steve Schwarzmann da defesa de meio Ambiente de Washington DC recebeu com reservas a auditoria do Banco Mundial, ao mesmo tempo em que zomba da classificação de categoria B concedida pelo IFC para o empréstimo. "Dizer que financiar a expansão da produção da soja no Amazonas em 2004 é um tipo de projeto que termina na porteira da fazenda, não é verossímil."

Negócios bancários com o ?ouro verde

Mais significativo do que as consequencias diretas do empréstimo do IFC, segundo o analista holandes Dros, é o prestígio que esse organismo internacional concedeu à Amaggi, o que por sua vez atraiu empréstimos ainda maiores de bancos privados. Rabobank, da Holanda, o maior banco agrícola, liderou um consórcio de 11 bancos, que incluem, ING Bank (Holanda), HSBC (Reino Unido), BNP Paribas (França), Crédit Suisse First Boston (Suiça), UFJ Bank (Japão), WestLB (Alemanha), Fortis Bank (Holanda/Bélgica), HSB Nord Bank (Suécia), Banco Bradesco e Banco Itaú (Brasil), para conceder um empréstimo à Amaggi de $230 milhões de dólares.

Esse é o segundo maior empréstimo que o Rabobank concedeu à Amaggi. O primeiro empréstimo de $100 milhões, em 2002, inclui os bancos ABN, Fortis, o Banco Cantonale, BBVA, WestLB, e o Standard Chartered, e ainda três bancos brasileiros.

Em setembro deste ano, o Rabobank lançou uma campanha publicitária se apresentando como um "banco que pões em prática a responsabilidade social ." O Rabobank é um dos signatários dos Princípios do Equador, que define linhas gerais para a administração das questões sociais e ambientais, e que também tem os seus próprios padrões oficiais para a proteção das florestas.

Dros, que escreveu vários estudos sobre a soja no Brasil e na América do Sul para o World Wildlife Fund e o AIDEnvironment, acredita que a aceitação do IFC deu aos bancos privados os subsídios para criar as suas próprias políticas. "A idéia do Rabobank é de que se IFC aprovou esse projeto e eles o classificam somente como projeto de risco baixo da classe B, eles podemos seguramente investir $230 milhões de dólares, oito vezes mais do que o IFC está investindo nesse corporação."

O gerente de assuntos públicos do Rabobank , Hans Ludo van Mierlo argumenta que o banco tem um recorde excelente em empréstimos ambientalmente corretos ?Nós não vemos nenhuma razão para as preocupações do presidente do Banco Mundial James Wolfensohn's, que está exigindo uma auditoria do empréstimo do IFC a Amaggi," diz van Mierlo. "A atual discussão entre as ONGs é sobre os procedimentos do IFC, que resultou na classificação de categoria B. isso é mais uma discusão interna sobre os procedimentos do IFC e não significa que a Amaggi está fazendo alguma coisa errada."

O grupo Maggi também recebeu um empréstimo de $24 milhões em março de 2001 de um sindicato de um banco estrangeiro o Deutsche Investitions und Entwicklungsgesellschaft (DEG), dois empréstimos liderados pelo Standard Chartered Bank em julho de 2001 e julho de 2002 no valor de $70 milhões e $50 milhões respectivamente, um empréstimo de $80 milhões conseguido pelo WestLB em junho de 2003 e outro de $34 milhões de dólares do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o banco de desenvolvimento brasileiro, em junho deste ano.

Schwarzmann da defesa Ambiental observa a ironia em o IFC emprestar dinheiro ao grupo Maggi, considerando-se a capacidade dessa corporação de obter empréstimos vultosos. "A justificativa que é ostensivamente oferecida para o [empréstimo do IFC] é de que se tomam recursos públicos para apoiar negócios privados, que não têm acesso aos mercados de capitais internacionais nos países em desenvolvimento," diz Schwarzmann. "O que o IFC fez com os empréstimos da Amaggi não é nada disso."

Pavimentando o paraíso

A controvérsia ao redor do IFC e dos empréstimos de bancos privados ao grupo Maggi chamou a atenção para para os potenciais danos ecológicos das empresas de agro-negócio, dos produtores de soja e corretores. Mas igualmente conseqüente tem sido o papel do Maggie em reconfigurar a região Amazônica, devido parcialmente ao substancial poder econômico e político da família Maggi.

O governador Maggi, como poder do governo do estado de Mato Grosso, e das empresas privadas que incluem a sua prórpia, construíram estradas, portos e expandiram os canais na Floresta Amazônica que, segundo críticos, abriram ainda mais a região para fazendas de soja, de gado e pequenos colonos.

Maggi iniciou a criação de estradas que cruzam o coração da Amazônia, que incluem a Estrada BR-163 atualmente em processo de pavimentação de Cuiabá, a capital do Mato Grosso, até o porto de Santarém. Asfaltar a BR-163 é parte de um projeto público privado entre o governo brasileiro, Maggi e os gigantes Norte Americanos do agro-negócio Cargill, Bunge, ADM e outros que querem uma maneira barata de exportar a soja. Segundo o Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazonia, or IPAM, essa Estrada de 1600 kilometros irá cortar 10 million hectares de terra coberta de mata na região, abrindo a área para mais colonização.

Blairo Maggi refuta as críticas daqueles que vem um conflito de interesse entre a sua posição como governador do Mato Groso e de maior produtor de soja do Brasil. "A minha plataforma eleitoral estava baseada na necessidade de manter o desenvolvimento econômico no Mato Grosso," Disse Maggi para a publicação Soybean Digest o ano passado . "Como governador, meu objetivo chave é....triplicar a produção agrícola em Mato Grosso em 10 anos, e desenvolver a agro-indústria para agregar valor à produção."

Não há um fim a vista?

Dado o poder dos interesses do agro-negócio como o grupo Maggi, a marcha em direção ao desmatamento motivado pela soja e a pecuária parece ser impossível de ser detida. Mas a expansão da soja dirigida à exportação pode ser detida pela demanda no momento.

Após atingir o preço mais alto em abril, o preço da soja deste então caiu para a metade no mercado mundial, parcialmente devido a produção recorde nos Estados Unidos e à queda na demanda pela China. O preço da soja começou a cair na primavera após a China se recusar a aceitar navios carregados de soja devido aos altos níveis de pesticidas encontrados na soja. Maggi estima que irá levar vários anos para o preço atingir o pico novamente.

No longo prazo, espera-se que a demanda da soja cresça. Desde que os consumidores continuem a exigir carne de gado alimentado com ração à base de soja e os bancos internacionais continuem a financiar o seu crescimento, o grupo Maggi vai continuar em operação. Enquanto isso, os ecosistemas vitais da mata Amazônica no Mato Grosso e do cerrado estão em perigo.

Sasha Lilley escritora do CorpWatch e produtora do Contra os Grãos [Against the Grain] da rádio Pacifica.

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