Contaminação genética pode conferir vantagem adaptativa a plantas invasoras

Por AS-PTA
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"Um grupo de pesquisadores da China observou que uma variedade invasora de arroz, considerada “planta daninha” nas lavouras, adquiriu vantagens adaptativas no meio ambiente quando cruzada com a variedade transgênica tolerante à aplicação do herbicida glifosato."

Na edição deste mês da revista científica New Phytologist foi publicado um artigo apresentando novas evidências de riscos das plantações transgênicas – desta vez para o meio ambiente. Na edição online da revista Nature foi publicada em 16 de agosto uma matéria relatando os principais resultados do estudo.

 

Um grupo de pesquisadores da China observou que uma variedade invasora de arroz, considerada “planta daninha” nas lavouras, adquiriu vantagens adaptativas no meio ambiente quando cruzada com a variedade transgênica tolerante à aplicação do herbicida glifosato – e mais: essa vantagem foi verificada mesmo na ausência do herbicida.

 

A modificação genética para conferir tolerância à aplicação de herbicidas é o tipo mais comum de transgenia na agricultura. A soja da Monsanto tolerante à aplicação do herbicida glifosato foi o primeiro cultivo transgênico a ser difundido em larga escala, e até hoje toda a soja e boa parte do milho, do algodão e da canola transgênicos plantados no mundo possuem (pelo menos) essa característica.

 

Nas lavouras tolerantes ao glifosato os agricultores pulverizam o produto sobre a plantação. O veneno mata todos os tipos de mato presentes no campo (até que estes se tornem resistentes), menos as plantas transgênicas.

 

Poucos estudos foram realizados no sentido de avaliar se, quando escapam para o meio ambiente, essas plantas transgênicas são mais competitivas para sobreviver e se reproduzir, bem como se isso também poderia ocorrer com variedades invasoras das plantas cultivadas ou espécies próximas que tenham adquirido a tolerância a herbicidas através da contaminação via polinização. Todas as liberações de transgênicos dos até hoje no Brasil se apoiaram na crença de que isso não aconteceria.

 

O recente estudo chinês coordenado por Lu Baorong, ecologista da Fudan University, em Shangai, investigou esta questão. Lu e seus colegas modificaram geneticamente o arroz comum para torná-lo resistente ao glifosato e depois cruzaram esse arroz modificado com uma variedade invasora de arroz. Os pesquisadores então deixaram essas plantas cruzarem entre si, criando uma segunda geração de híbridos que eram idênticos um ao outro, exceto pelo número de cópias do gene que codifica a produção da enzima EPSP-sintase – a enzima que é inibida com a aplicação do glifosato e que, nas plantas transgênicas tolerantes ao herbicida, é produzida em grande quantidade, o que as permite suportar os efeitos do veneno. Lembre-se que o número final de cópias dos transgene na planta modificada não é atributo controlável pela técnica. Como previsto, as plantas com mais cópias do gene expressaram níveis mais altos da enzima. Mas os pesquisadores descobriram também que esses híbridos transgênicos tinham taxas mais altas de fotossíntese, produziram mais brotos e flores e produziram 48-125% mais sementes por planta do que os híbridos não transgênicos – na ausência do glifosato.

 

Segundo Lu, tornar o arroz selvagem mais competitivo poderia exacerbar os problemas que ele causa aos produtores ao redor do mundo.

 

Brian Ford-Lloyd, geneticista de plantas da Universidade de Birmingham, no Reino Unido, explica que “se o gene que codifica a enzima EPSP-sintase contaminar as variedades selvagens de arroz, sua diversidade genética, cuja conservação é realmente importante, pode ser ameaçada pois o genótipo com o transgene poderá vencer a competição com as variedades normais.” O geneticista avalia que “este é um dos mais claros exemplos de efeitos danosos extremamente plausíveis das lavouras transgênicas no ambiente”.

 

O estudo também desafia a percepção pública de que lavouras modificadas geneticamente para apresentar cópias extras de seus próprios genes seriam mais seguras do que aquelas que contêm genes de microrganismos. “Nosso estudo mostra que este não é necessariamente o caso”, afirma Lu.

 

Talvez mais surpreendente do que os resultados do novo estudo seja o fato de pesquisas como essa não terem sido exigidas e realizadas antes da liberação dessas plantas em larga escala no meio ambiente. Lá se vão vinte anos desde que plantas transgênicas começaram a ser cultivadas comercialmente e somente agora começam a fazer volume os estudos independentes para avaliar os efeitos dessas plantas sobre o meio ambiente e a saúde. E o que é pior: até agora, com exceção do caso da Europa, as novas evidências científicas que têm sido publicadas comprovando a existência de riscos não têm sido suficientes nem para reverter liberações já concedidas, nem para frear novas liberações. Fato que reforça que as decisões são tomadas não com base em ciência, não ao menos numa ciência desinteressada.

 

Com informações de:

 

Genetically modified crops pass benefits to weeds – Nature, 16/05/2013.

 

Leia na íntegra (em inglês) o artigo científico intitulado “ A novel 5-enolpyruvoylshikimate-3-phosphate (EPSP) synthase transgene for glyphosate resistance stimulates growth and fecundity in weedy rice (Oryza sativa) without herbicide”.

 

Fuente: AS-PTA

Temas: Transgénicos

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