Brasil: milho transgênico: lobby quer liberação comercial para próxima safra

Ambientalistas acusam empresas interessadas na liberação acelerada do milho transgênico de querer atropelar as regras que elas mesmas criaram para a CTNBio. Na opinião das organizações do movimento socioambientalista reunidas na Campanha por um Brasil Livre de Transgênicos, a verdadeira intenção por trás do lobby que tentou convencer o presidente Luiz Inácio Lula da Silva a promover uma “caça às bruxas” na Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) é liberar o plantio comercial do milho transgênico já para a próxima safra, prevista para outubro

Dirigente da Campanha e também da organização Terra de Direitos, a advogada Maria Rita Reis acusa as empresas interessadas na liberação acelerada do milho transgênico de querer atropelar as regras que elas mesmas criaram para a CTNBio: “Querem, com a bola rolando, alterar as regras do jogo que eles mesmos criaram. Só conseguirão aprovar o milho transgênico para outubro se passarem por cima das regras da CTNBio. Essas regras determinam que os processos devem ser distribuídos para todos os conselheiros e que cada um deles pode pedir vista. Isso sem falar que também estão previstas consultas públicas. Liberar o milho para a próxima safra, só se for na base do golpe”, diz.

Os diversos pedidos de liberação comercial de milho transgênico que aguardam na fila da CTNBio dizem respeito a cinco variedades de grãos geneticamente modificados, entre eles o milho RR, desenvolvido pela transnacional norte-americana Monsanto, e o milho Bt, desenvolvido pela transnacional suíça Syngenta. A Bayer e a BASF também têm pedidos de liberação de variedades de milho encaminhados à Comissão.

O último boletim da Campanha por um Brasil Livre de Transgênicos afirma que a pressão por mudanças imediatas na CTNBio nasceu de um racha entre os setores que defendem a liberação facilitada dos transgênicos: “A lista de temas sobre os quais a CTNBio se debruçou desde janeiro é extensa e as pautas foram elaboradas por proposta da presidência, ou seja, segundo os interesses dos defensores da liberação desregulada dos transgênicos. Se ela não agradou aos lobistas das empresas é porque os cientistas preferiram acelerar as decisões sobre os certificados de qualidade em biossegurança dos laboratórios e as liberações de pesquisas cujos pedidos estavam parados há dois anos. Para as empresas, estes são interesses menores, pois o que querem é a liberação comercial do milho transgênico ainda para a safra 2006/2007”, diz o documento.

O boletim também refuta a idéia de que os setores contrários aos transgênicos estariam politizando excessivamente os debates e sabotando os trabalhos da CTNBio: “Os defensores dos transgênicos na Comissão têm se revelado pouco afeitos ao debate de idéias e consideram que todo argumento contrário ao seu credo é político. Não interessa se as posições são defendidas com sólida argumentação científica baseada em pesquisas publicadas em revistas especializadas, os xiitas pró-transgênicos a tudo desqualificam como ideologia ou política. Embora sejam amplamente majoritários, já que o ministro da Ciência e Tecnologia os escolheu a dedo entre os militantes pró-transgênicos, alguns cientistas que compõe a Comissão se enervam com o debate e querem decidir sem argumentação contraditória. No fundo, o que eles querem é uma comissão do pensamento único”.

Carta a Lula

Diversas organizações enviaram nessa terça-feira (8) uma carta a Lula na qual alertam o presidente sobre as reais intenções dos lobistas: “Neste momento, o que querem os lobistas é uma rápida liberação do cultivo comercial do milho transgênico ainda para a semeadura da safra 2006/2007. No entanto, não há como iniciar a análise das solicitações de liberação comercial sem antes definir os critérios de avaliação de risco que serão usados pelos pareceristas, distribuir os pedidos de liberação para avaliação dos especialistas e discutir em plenária os pareceres, que precisam obter dois terços dos votos dos membros da CTNBio. Estes procedimentos ainda não foram iniciados porque há uma extensa pauta de normas e decisões de liberação de pesquisas que foram colocadas em discussão prioritária pela maioria da Comissão”.

A carta das ONGs a Lula afirma que a aprovação da Lei de Biossegurança “foi muito comemorada pelo lobby das empresas de biotecnologia e pela bancada ruralista, porque subtraiu as competências do Ibama e da Anvisa relativas à avaliação de riscos ao meio ambiente e à saúde, concentrando poderes na CTNBio”. Agora, denunciam os ambientalistas, “estes mesmos setores questionam duramente a atuação da Comissão, solicitando mais mudanças na legislação e criticando a atuação de representantes de alguns ministérios e da sociedade civil. Eles querem que a CTNBio seja um mero guichê de aprovação dos transgênicos”. Os ambientalistas também exortaram o presidente a respeitar o compromisso com o Princípio da Precaução assumido pelo Brasil na Convenção sobre Diversidade Biológica da ONU.

Reunião positiva

Na opinião de Maria Rita Reis, a reunião dos onze ministros do Conselho Nacional de Biossegurança foi positiva: “Apesar do carnaval que fizeram na mídia, ficou claro que os atrasos que existem na CTNBio não são causados pelos ‘ecofundamentalistas’ e que não existe nenhum movimento de sabotagem da parte dos conselheiros que defendem uma posição de maior cautela em relação aos transgênicos”, avalia. Ela, no entanto, considera “complicadíssima” a mudança na metodologia de trabalho da Comissão: “É impossível avaliar corretamente os pedidos de liberação comercial sem que sejam revistas todas as instruções normativas à luz da Lei de Biossegurança”, diz.

Maria Rita afirma apoiar a criação de uma estrutura para dar suporte ao trabalho dos conselheiros da CTNBio: “Sempre defendemos que a CTNBio tivesse uma boa estrutura para facilitar o seu funcionamento. É um absurdo imaginar que uma comissão de apenas 27 membros, todos com atividades paralelas prioritárias, possa ser responsável pela definição da política de biossegurança de um país”.
Agência Carta Maior, 09/08/2006.

Campanha Por um Brasil Livre de Transgênicos
Boletim Número 311 - 11 de agosto de 2006
E-mail: rb.gro.atpsa@socinegsnartedervil

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