Brasil: mudanças no projeto de lei sobre Biossegurança só atendem aos interesses do negócio da biotecnologia

Pela nova proposta, a decisão sobre a necessidade de licenciamento ambiental, que para qualquer outra atividade que apresente potencial de degradação do meio ambiente, cabe ao Ibama, ficaria sob o julgo da CTNBio nos casos de pesquisa e plantio de transgênicos

Boletim 221 - 13 de agosto de 2004

Dois principais acontecimentos envolvendo os transgênicos marcaram esta semana. Um deles foi a confirmação por parte do Ministério da Agricultura (MAPA) de cultivos clandestinos de algodão transgênico no Mato Grosso. O outro foi a aprovação, na Comissão de Educação do Senado Federal, de um projeto de lei (PL) sobre Biossegurança substitutivo ao PL aprovado em fevereiro pela Câmara dos Deputados.

As suspeitas de plantios ilegais de algodão transgênico já foram pauta várias vezes de notícias em jornais e na mídia eletrônica. Em abril deste ano o diretor de assuntos corporativos da Monsanto tornou pública a suspeita, como divulgado no número 204 deste Boletim. Mais recentemente, por ocasião da visita de compradores asiáticos e europeus às fazendas algodoeiras do Mato Grosso, os produtores afirmaram existirem os tais plantios com as sementes transgênicas.

Após a inspeção recente de fazendas na região, o MAPA afirmou ter encontrado três áreas nas quais se estava produzindo o algodão transgênico. Segundo o Secretário de Defesa Agropecuária do ministério, Maçao Tadano, o plantio de algodão transgênico é crime previsto em lei e seus responsáveis deverão ser autuados. Mas segundo o próprio ministério, a destruição ou não das lavouras dependerá das justificativas que os produtores apresentarem. Ou seja, se estes forem bom de papo, as coisas podem ser relativizadas.

Cabe agora ao governo enrijecer a fiscalização e combater desde já esses plantios, caso não queira ver reeditado o episódio da soja no Rio Grande do Sul e ser em breve pressionado pela edição de medidas provisórias autorizando o plantio que fugiu de seu controle.

No plano político, é sabido, e não de hoje, que as motivações que levam o senador Osmar Dias (PDT/PR) a ser o líder pró-transgênicos no Senado têm raízes em seu estado de origem. Lá, o governador Roberto Requião (PMDB), contra quem o senador guarda rivalidade política e pessoal, assumiu a iniciativa de manter o estado livre de transgênicos. E o que mais deve incomodar o senador é que os resultados positivos dessa postura vêm sendo comprovados dia a dia.

Itália, Alemanha e França já manifestaram seu interesse em estabelecer contratos de médio e longo prazo de compra da soja paranaense não-transgênica. E, de acordo com estimativas da Secretaria Estadual de Agricultura, passa dos 60 milhões de reais a economia resultante do não-pagamento de royalties à multinacional Monsanto, detentora das patentes sobre a semente da soja modificada.

O projeto substitutivo aprovado pela Comissão de Educação, sob relatoria do senador Osmar Dias (que também preside a Comissão), escancara o país à adoção comercial de produtos transgênicos sem que para isso seja necessária a realização de avaliações de riscos à saúde e ao meio ambiente. Para tanto, o senador propõe que a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança -- CTNBio -- seja o órgão responsável por decidir sobre a liberação de pesquisas e sobre o uso comercial de transgênicos. Tal prerrogativa em favor da CTNBio é complementada pelo afastamento das atribuições dos órgãos técnicos dos ministérios. Porém, em nenhum momento, os motivos para a mudança de atribuições são justificados.

Pela nova proposta, a decisão sobre a necessidade de licenciamento ambiental, que para qualquer outra atividade que apresente potencial de degradação do meio ambiente, cabe ao Ibama, ficaria sob o julgo da CTNBio nos casos de pesquisa e plantio de transgênicos.

As decisões da CTNBio poderiam ser questionadas pelos órgãos da administração pública envolvidos, mas o julgamento final ficaria a cargo da própria CTNBio (!).

O parecer ainda exclui a necessidade de rotulagem para produtos transgênicos ou seus derivados que não tenham fins alimentícios, como vacinas, remédios e cosméticos.

Caso esse relatório seja aceito pelo Senado, o plantio da soja transgênica ficará definitivamente legalizado no país. Não custa lembrar que em 1998 a CTNBio autorizou a liberação da soja da Monsanto sem a realização de qualquer avaliação de riscos e com base em um relatório que a própria empresa apresentou, baseado em dados coletados nos Estados Unidos.

O relatório da Comissão de Educação também indica a liberação do uso de células humanas embrionárias para pesquisas com fins terapêuticos.

Dizem os congressistas que o projeto de Biossegurança será votado na última semana de agosto, quando os políticos deixarem as campanhas eleitorais e se voltarem ao trabalho legislativo para uma semana de esforço concentrado no Congresso.

Até lá teremos que pressionar fortemente senadores e deputados a rejeitarem essas mudanças, que só atendem aos interesses do pequeno grupo de multinacionais do bilionário negócio da biotecnologia. Além de telefonar e solicitar audiências com os representantes de seu estado em Brasília, você também pode expressar sua indignação com relação a tamanho descompromisso com a sociedade enviando mensagens aos senadores através da página do Idec na internet, no endereço http://www.idec.org.br/carta_modelo.asp?id=37 .

Não deixe de expressar sua opinião!

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