Protocolo de Cartagena: posições que o Brasil defenderá

O Protocolo de Cartagena de Biossegurança está para a Convenção da Diversidade Biológica (CDB) assim como o Protocolo de Kyoto está para a Convenção sobre Mudança do Clima. O Brasil é Parte das duas e já teve ambos os Protocolos ratificados pelo Congresso Nacional

s@raC s@gima,

O Protocolo de Kyoto é sem dúvida mais conhecido. Os efeitos danosos da civilização moderna sobre o funcionamento do globo são cada vez mais visíveis e difíceis de serem contestados. Além disso, dois outros fatores contribuem para essa maior popularidade do Protocolo de Kyoto. Um deles é sua maior presença na imprensa. O outro é o destaque que ele ganha pelo fato de o maior consumidor de recursos naturais do planeta, os Estados Unidos, não aceitar implementar regras de controle de emissão de gases poluentes com a justificativa de que isso pode lhe trazer prejuízos econômicos.

Já no Protocolo de Biossegurança, concluído e adotado pelas Partes em janeiro de 2000, após um processo que levou seis anos, os EUA não podem participar das reuniões de negociação sobre sua implementação, já que o país não é parte da CDB. Apesar disso, sua influência nos avanços para a implementação de regras para a importação e exportação de organismos transgênicos com base no princípio da precaução são pra lá de perniciosas. Mesmo não estando presente nos espaços de decisão, suas posições são levadas adiante pelo Grupo de Miami, que compreende o Canadá, a Austrália, a Argentina, o Chile e o Uruguai.

A cidade de Montreal, no Canadá, sediará entre os dias 30 de maio e 03 de junho o segundo encontro das partes (MOP2) do Protocolo de Cartagena. Em 2006 será a vez do Brasil, que receberá a terceira edição do encontro, dando continuidade às discussões e negociações para a implementação do Protocolo.

Para a reunião de Montreal, representantes de diferentes ministérios vêm se reunindo para discutir os temas que estarão na agenda da MOP2 e para fechar as posições que o Brasil defenderá. Os Ministérios da Agricultura, Ciência e Tecnologia e Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior pressionam por posições que, caso aceitas, podem levar a uma banalização do acordo. A principal e mais contenciosa delas diz respeito à documentação e identificação de cargas destinadas a alimentação humana, ração animal ou processamento. Os mesmos ministérios que defenderam poderes totais para a CTNBio liberar transgênicos, demonstram agora querer buscar um alinhamento ao Grupo de Miami e forçar um retrocesso nas negociações.

Para este grupo de ministérios, que têm a mesma posição das indústrias de agrotóxicos e transgênicos, entidades do agronegócio e indústrias exportadoras de óleos vegetais e de cereais, basta que um carregamento traga a informação "pode conter" transgênicos. Recusam um sistema de documentação mais completo com a justificativa de que isso pode lhes trazer prejuízos econômicos -- esquecem-se de que o Protocolo, além de não estar subordinado a nenhum outro acordo internacional, diz respeito à Biossegurança, e não ao comércio. Com uma informação vaga e imprecisa como essa, todo o resto do Protocolo torna-se sem sentido, uma vez que ficam inviabilizadas as medidas previstas de precaução, rotulagem, rastreabilidade, segregação, análise e manejo do risco e monitoramento pós-consumo ou introdução no ambiente. A informação precisa e completa oferecida pelo país exportador é o ponto de partida para a implementação das demais normas de biossegurança, e deve conter, no mínimo: os eventos de transformação de cada OGM; os nomes comum e científico, gene de modificação que foi inserido e informação sobre espécies doadoras e receptoras dos genes; as recomendações para manuseio, armazenagem, transporte e uso seguros; as medidas a serem adotadas em casos de acidente; e o resumo da avaliação de risco a que o produto foi submetido.

Nos últimos anos o Brasil tem buscado se fazer cada vez mais presente no cenário internacional, inclusive nas Nações Unidas. Pegaria muito mal, aqui e lá fora, o Brasil fazer com este protocolo o que os EUA fazem com Kyoto.

Errata: A matéria "Transgênicos em programas de ajuda alimentar na Bolívia" divulgada no Boletim 253 é de 2001, e não de 09/05/2005.

Campanha por un Brasil Livre de Transgênicos
Boletim Número 254 - 20 de maio de 2005

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