Estudo usado como um sinal verde para o cultivo do milho transgênico no México?

Uma pesquisa divulgada nesta semana vem provocando grande debate no meio acadêmico por contradizer os estudos anteriores que comprovaram a contaminação por transgênicos do milho cultivado em comunidades indígenas e camponesas no México

CAMPANHA POR UM BRASIL LIVRE DETRANSGÊNICOS
Boletim Número 265 - 12 de agosto de 2005

s@gimAs@raC,

Ignácio Chapela, autor do estudo que revelou o problema ao mundo, se disse "bastante surpreso, principalmente porque os autores desse estudo são os mesmos que um ano atrás confirmaram a contaminação". Após a publicação dos dados de Chapela em 2001 na revista Nature, o governo mexicano conduziu suas próprias investigações e chegou à mesma conclusão, ou seja, que o milho transgênico contaminou variedades nativas, ou crioulas, do país.

A importância da diversidade genética para os agricultores mexicanos e a enorme a polêmica gerada desde então levaram a Comissão para a Cooperação Ambiental da América do Norte (CAC, criada em 1994 pelo Canadá, México e Estados Unidos para contribuir com a conservação, proteção e melhoramento do meio ambiente da América do Norte) a aceitar a solicitação de associações de campesinos e indígenas das comunidades afetadas, organizações da sociedade civil mexicana e organizações internacionais que pediam a realização de um estudo independente para avaliar a extensão do problema. O relatório elaborado pelo secretariado do CAC foi divulgado há um ano e, entre suas recomendações, está a manutenção da moratória ao cultivo comercial de milho transgênico no México.

Ao tratar da presença de transgenes no México, o estudo do CAC é claro ao dizer que "Os transgenes foram introduzidos em algumas variedades tradicionais de milho no México. Isso foi confirmado mediante investigações científicas conduzida pelo governo mexicano. No entanto, esses resultados ainda não foram publicados e a informação difundida até agora é vaga. Em todo caso, não resta dúvida de que os transgenes estão presentes no milho mexicano e se propagam". Sobre as fontes de contaminação o relatório do CAC relata que "Constantemente entra no México milho transgênico vivo, principalmente através das importações de grãos, mas também trazidos por trabalhadores imigrantes que voltam dos Estados Unidos. A principal fonte provável dos transgenes presentes nas variedades do milho mexicano é o grão cultivado nos Estados Unidos [que é distribuído a comunidades rurais pelo governo sem informação de que é transgênico]". A liberalização do mercado na América do Norte tornou impossível a concorrência do milho mexicano com o produto subsidiado americano, quebrando muitos agricultores e tornando o país de origem do milho dependente de importações.

Outras medidas foram tomadas para se avaliar a extensão da contaminação. Em outubro de 2003 a Rede em Defesa do Milho, integrada por camponeses, comunidades indígenas e organizações da sociedade civil, divulgou os resultados de seu próprio estudo sobre a contaminação transgênica em nove estados do México. Usando kits comerciais de detecção, representantes comunitários amostraram 5 mil plantas de 134 comunidades. Os resultados mostraram diferentes graus de contaminação. Essa amostragem foi mais ampla que a do estudo desta semana, publicado na revista da Academia de Ciências dos Estados Unidos (PNAS, na sigla em Inglês), que analisou 870 plantas em 125 localidades.

Peter Rosset, doutor em ecologia e ex-professor de estatística, criticou a metodologia do estudo publicado no PNAS. Para ele a área amostral foi menor que a das pesquisas anteriores e a resolução dos testes de detecção usados foi inferior à empregada por Chapela e Quist em 2001. Assim, uma contaminação freqüente e dispersa, mas em baixos níveis, como a mexicana, não poderia ser detectada pelo método empregado.

Baldemar Mendoza, camponês representante da UNOSJO (Unión de Organizaciones de la Sierra Juárez de Oaxaca) disse que "se um novo estudo diz que não encontraram contaminação talvez seja porque o nível de contaminação sempre foi muito baixo nessa área em particular, já que para nós o resultado também deu negativo. Mas pode ser também que o trabalho de descontaminação que vimos fazendo em muitas comunidades esteja dando certo. De qualquer forma, se os esforços para descontaminar deram resultados, não é devido à campanha de educação do governo, mas sim do empenho das comunidades em recuperar nossas sementes, controlar as que vêm de fora, justamente as que são de responsabilidade do governo, eliminar as plantas estranhas ou deformadas que vemos e muitas outras coisas".

Rosset tem uma avaliação semelhante. Ele crê que uma resposta equilibrada sobre este estudo deveria ser algo como: "caso provada que [a não-contaminação] é verdade, então o mérito é dos camponeses e indígenas que foram capazes de desenvolver seus próprios métodos de descontaminação do milho sem apoio do Estado. Mas, infelizmente, há uma série de aspectos metodológicos no estudo que tornam muito difícil dizer que não há níveis detectáveis de contaminação genética no milho mexicano".

Mendoza conclui dizendo que "Nos preocupa muito que este estudo seja usado como um sinal verde para o cultivo do milho transgênico no México, e nos sobrecarregue ainda mais aos camponeses e povos indígenas com o trabalho de controlar os problemas que ele causa. O único controle é não plantar transgênicos. Não precisamos de campanhas educacionais nem de mais estudos. Não queremos sementes trangênicas que só servem para aumentar o lucro de empresas multinacionais e colocar em risco nossa herança mais importante, o milho, produto de trabalho de camponeses e indígenas durante os últimos 10 mil anos".

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- O estudo "Absance of detctable transgenes in local landraces of maize in Oaxaca, México (2003 - 2004), S. Ortiz-García, E. Ezcurra, B. Schoel, F. Acevedo, J. Soberón, e A. A. Snow" pode ser obtido em inglês aqui

- Sobre o estudo da Red en Defensa del Maíz, ver aqui

- O estudo do CAC "Maíz y biodiversidade: efectos del maíz transgênico en México" pode ser obtido em espanhol aqui

Campanha Por um Brasil Livre de Transgênicos
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