Coletivo de Diversidade da Via Campesina lança campanha: Basta de violência contra LGBTI+ do campo, das águas e das florestas

Idioma Portugués
País Brasil

“Sem LGBTI+ não há revolução.” Com essa afirmação, o Coletivo de Diversidade da Via Campesina reafirma que a luta pela transformação social só é completa quando inclui todas as identidades e corpos do campo, das águas e das florestas. Durante o II Congresso Nacional do Movimento de Mulheres Camponesas, o coletivo lançou a campanha com o objetivo de promover o enfrentamento às violências que afligem as populações LGBTI+ nesses territórios.

A iniciativa busca conscientizar a base social do movimento sobre diversidade sexual e de gênero, o combate à violência e a integração da pauta LGBTI+ nas lutas contra o agronegócio, nas pautas de reforma agrária, nos enfrentamentos ao hidro e mineronegócio e nas organizações camponesas que compõem a Via Campesina.

De acordo com o  Atlas da Violência no Brasil, divulgado pelo Ipea este ano, a violência contra pessoas LGBTI+ cresceu mais de 1.000% na última década. O relatório aponta o aumento de casos de homossexuais, bissexuais e pessoas trans atendidas em hospitais por agressões — embora nem todos sejam necessariamente decorrentes de LGBTI+fobia. Entre 2014 e 2023, houve um crescimento de 1.193% nos casos de violência contra homossexuais e bissexuais no Brasil, de 1.111% contra mulheres trans, de 1.607% contra homens trans e de 2.340% contra travestis.

O volume de denúncias de casos de LGBTI+fobia também aumentou nos últimos anos. Segundo dados do Disque 100, serviço do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC) que documenta violações de direitos humanos, 5.741 casos foram registrados até setembro deste ano. No ano anterior, foram feitas 6.070 denúncias — 2.122 a mais que em 2022 (3.948).

Invisibilização e negação de direitos

Os debates sobre diversidade sexual e territórios vêm sendo construídos pelos movimentos sociais no Brasil e em diversos países, ampliando o olhar sobre as múltiplas formas de opressão. As lutas contra as explorações capitalistas e neocoloniais também enfrentam estruturas patriarcais e heterocisnormativas, que negam o direito à existência plena e contrariam os princípios agroecológicos de cuidado e respeito aos modos de vida. As identidades se formam na relação entre corpo, território e expressão da sexualidade — elementos que, juntos, afirmam o direito de existir e resistir.

Diversidade no campo, nas águas e nas florestas

Assim como nas áreas urbanas, os territórios rurais, ribeirinhos, indígenas e as comunidades tradicionais também são construídos pela diversidade sexual e de gênero. A auto-organização dentro desses espaços tem ampliado a luta contra o patriarcado e seus sistemas heteronormativos.

A luta por soberania nos territórios é a afirmação do direito dos povos de decidirem sobre suas próprias vidas, modos de viver, de plantar, de amar e de resistir. Soberania não é apenas controle sobre a terra — é também pertencimento, memória, cuidado coletivo e autodeterminação. Para as pessoas LGBTI+, existir nesses territórios é um ato político, pois desafia o modelo dominante que tenta apagar tudo aquilo que não se encaixa.

Para Maria Santos de Jesus, do Movimento de Pequenos(as) Agricultores(as) – MPA e representante do Coletivo de Diversidade da Via Campesina, essa construção é histórica: “Nós historicamente construímos nossas lutas, e a nossa bandeira de luta é mais do que identitária. Não estamos nas lutas nos organizando apenas para nos reconhecer, mas sim para a criação de ações efetivas contra as violências que afetam as populações LGBTI+ do campo, das águas, das florestas e das cidades”.

“O movimento camponês, as mulheres camponesas, se propõem a construir a revolução, a organizar as mulheres do campo […] portanto, a população LGBTI+ também é parte dessa luta revolucionária — contra o machismo, contra o patriarcado, contra o racismo. Nós existimos e, assim como o lema desse encontro, existimos porque lutamos”, completa.

De acordo com Valcilene Lobato, militante do Movimento de Mulheres Camponesas (MMC) do Espírito Santo, é preciso avançar nessa luta. “Vivemos em uma sociedade patriarcal e LGBTfóbica, e nós, enquanto movimentos sociais, se não olharmos para essas violências, para esses padrões que a sociedade nos impõe, corremos o risco de reproduzi-los também dentro dos nossos movimentos”.

“Nós, nesse momento, vamos para além de uma questão de identidade individual. Vivemos numa sociedade machista, capitalista, patriarcal e racista, que constrói a violência contra pessoas LGBTI+ e o conservadorismo de padrão e de família na sociedade. Nós dizemos sim para quem somos e não nos escondemos. Participamos sempre das atividades políticas nos campos, nas águas e nas florestas e ocupamos os espaços de luta”, completa.

A campanha Basta de violência contra LGBTI+ do campo, das águas e das florestas contará com ações nos territórios e espaços de formação dos movimentos, além da produção de materiais educativos, como cartazes, cartilhas e ações conjuntas e coletivas de acolhimento e debate. O Coletivo de Diversidade da Via Campesina reforça que a transformação dos territórios passa também pela transformação das relações. A Via Campesina é uma organização internacional que contribui no alinhamento de um conjunto de lutas com camponesas, trabalhadores agrícolas, mulheres rurais e comunidades indígenas e negras da Ásia, África, América e Europa.

Fonte: Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA)

Temas: Feminismo y luchas de las Mujeres, Movimientos campesinos

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