Fome é questão política, afirma Greenpeace, por Herton Escobar
Para entidade, Vaticano erra ao defender transgênicos, virtual monopólio da Monsanto
Os recentes pronunciamentos do Vaticano em favor dos transgênicos não amenizaram em nada a oposição do Greenpeace a essa tecnologia. A Santa Sé, segundo os ambientalistas, engana-se ao propor o cultivo de alimentos geneticamente modificados como uma das soluções para a fome no mundo. "O mundo já produz alimentos suficientes, tanto que temos safras recordes e fome recorde ao mesmo tempo", argumenta a coordenadora da campanha de Engenharia Genética do Greenpeace no Brasil, Mariana Paoli.
A fome, segundo ela, é uma questão política e social, e não de tecnologia. A liberação dos transgênicos, acreditam os ambientalistas, deixaria a produção de alimentos sob o controle de multinacionais. Nesse cenário, a maior criticada é a Monsanto, empresa que desenvolveu a tecnologia de plantas transgênicas. "Mais de 90% das sementes transgênicas plantadas hoje no mundo são da Monsanto", acusa Mariana. "Não podemos deixar a produção de alimentos nas mãos de umas poucas empresas."
Além dos produtos de multinacionais, que foram os primeiros a chegar ao mercado - principalmente commodities, como soja, milho, canola e algodão -, centenas de projetos públicos estão sendo desenvolvidos ao redor do mundo para a criação de novos alimentos transgênicos, muitos deles produtos da agricultura familiar. Só no Brasil, por exemplo, há projetos avançados para o desenvolvimento de feijão, mamão, batata, alface, maracujá e tomate, além de café e cacau geneticamente modificados.
Muitos pesquisadores apostam também que a oposição diminuirá com a chegada da segunda geração de transgênicos, com plantas modificadas para ser mais nutritivas e saudáveis. Mariana já adianta, entretanto, que o Greenpeace será contra qualquer planta transgênica. "Todos os nutrientes que precisamos já estão presentes na nossa alimentação", diz. "Não temos segurança de que esses produtos não trarão risco para a saúde."
Cientistas insistem que a avaliação dos transgênicos deve ser feita caso a caso. A segurança dos produtos atuais tem o aval da Organização Mundial da Saúde e pelo menos sete grandes academias de ciência do mundo. O Greenpeace, entretanto, não está convencido. "Os transgênicos não são seguros nem para o meio ambiente nem para a saúde; nem mesmo o algodão", diz Mariana. "A falta de evidências decorre justamente da falta de estudos."
O Estado de São Paulo, Brasil, 6-8-03