Carta Final da 7ª Semana e Romaria do Cerrado
Esta 7ª edição da Semana e Romaria do Cerrado, realizada no município de Serra Dourada, marcou a retomada deste importante momento. Com programação ampla, teve o marco inicial com o Envio da Cruz Geraizeira no dia 31 de agosto, durante a missa, em Colônia do Formoso, município de Coribe, guardião da cruz desde a última romaria.
Para onde vamos diante da crise da água e do clima?
Cerrado: Jardim de Deus, berço das Águas!
“A crise ecológica é um apelo a uma profunda conversão interior. Viver a vocação de guardiões da obra de Deus é parte essencial de uma existência virtuosa.” Papa Francisco, Laudato Si (n.217)
O município de Serra Dourada, no Oeste da Bahia, possui população de 17.066 habitantes (IBGE 2022). Fundado em 12 de abril de 1962, tem como padroeiro São Gonçalo do Amarante. Situado nos biomas Caatinga e Cerrado, geograficamente se destaca por ser um vale que vai do Morro do Bode ao contraforte da Serra Geral, seus principais cursos d´água são os riachos de São Gonçalo, Serra Dourada, Tauá, Caracol e dos Porcos, que compõem a Bacia Hidrográfica do rio São Francisco.
Em Serra Dourada as atividades iniciaram em 08 de setembro com os preparativos nas escolas e comunidades, e no dia 11, Dia Nacional do Cerrado, houve intensa programação envolvendo as escolas São Gonçalo e Mauro Rodrigues e a realização de encontros em 07 setores da paróquia, abrangendo 34 comunidades rurais, animada por uma equipe missionária composta por 22 pessoas. Momentos significativos de peregrinação, intercâmbio de saberes, reafirmação da fé e da esperança que não se apaga.
A partir do tema “Para onde vamos diante da crise da água e do clima?”, as reflexões foram oportunidades de diálogo acerca da realidade socioambiental local onde muitas pessoas fizeram memória de como era este município em tempos de outrora, um lugar de fartura, riquezas, e de águas abundantes nas nascentes, nos marimbus, brejos, córregos, riachos e lagoas, espaço privilegiado de produção de alimentos, especialmente a cana de açúcar e o arroz, como relatou uma participante: “meu pai já chegou a colher 200 sacas de arroz nestes brejos”. No entanto, esta realidade mudou, sobretudo, nos últimos 40 anos, com a diminuição e secamento das águas, a exemplo dos marimbus João Jorge e Porteiras e dos riachos Tauá, Caracol e dos Porcos; e os que pedem socorro, São Gonçalo e Serra Dourada.
Ao longo do tempo houve mudança da agricultura de subsistência para a pecuária que favoreceu o desmatamento em larga escala para dar lugar às pastagens, com consequências na diminuição das águas e mudança no clima, em que a cada ano as chuvas diminuem e vêm de forma irregular, as secas estão mais longas e o tempo mais quente se comparando ao deserto em que durante o dia é extremamente quente e as noites mais frias. Algumas das principais consequências são a diminuição da produção de alimentos e a perda da biodiversidade, como relatou uma participante: “com o desmatamento os animais silvestres estão se aproximando das casas em busca de água e alimento”.
Outras preocupações foram evidenciadas como as queimadas, abertura indiscriminada de poços artesianos, o problema do lixo com excesso de plásticos espalhados pelas comunidades e a ausência de educação ambiental. Além do uso de agrotóxico que mata a terra como no relato: “do mesmo jeito que a terra morre, está morrendo também as pessoas e os animais”.
Um momento importante foi a partilha do mapeamento das águas com o título “A morte das águas no Oeste da Bahia”, feito pelas organizações populares e comunidades, onde foram identificados mais de 3 mil trechos de água mortas e outros 580 em situação crítica; somando 7.120 mil km de rios secos, nas sub bacias do Carinhanha e Corrente. Soma-se às preocupações o recente PL da devastação (Lei 2.159/2021) aprovado na Câmara e no Senado Federal e sancionado com vetos pelo presidente Lula em agosto deste ano, que afrouxa as normas de licenciamento ambiental, um retrocesso nas leis ambientais que decreta a extinção dos biomas ainda restantes. Tudo isso é manobra de um perverso modelo econômico e de produção que visa o lucro de poucos em detrimento de uma população dependente destas águas para viver.
Neste ano Jubilar, cujo lema é “A esperança não decepciona” (Romanos 5,5), os sinais de esperança expressados nos compromissos assumidos nesta Semana e Romaria do Cerrado são com a proteção e recuperação de nascentes; plantio de árvores nativas do Cerrado e Caatinga; educação ambiental em todas as dimensões; fortalecimento da produção de alimentos saudáveis; e as resistências nas lutas em defesa dos territórios, das águas e da biodiversidade do nosso Cerrado.
O ponto alto da Semana do Cerrado foi a 7ª romaria realizada no dia 12 de setembro, com expressiva caminhada em que romeiros e romeiras – “Peregrinos da Esperança”, conduzidos pela cruz geraizeira, nutridos pelo testemunho dos Mártires da Caminhada e inspirados pelo lema Cerrado: Jardim de Deus, berço das Águas! reafirmaram os compromissos no cuidado com a nossa Casa Comum, dom de Deus, descrito poeticamente no livro da Criação com a formação do Jardim do Éden, Gênesis 2, “E plantou o Senhor Deus um jardim em Éden… e fez brotar da terra toda árvore agradável à vista e boa para comida… E saía um rio do Éden para regar o jardim, e de lá se dividia em quatro braços… E tomou o Senhor Deus o homem e o pôs no jardim de Éden para cultivar e guardar”.
Serra Dourada, Bahia, 12 de setembro de 2025.