Brasil: CTNBio: responsável pela liberação comercial de transgênicos

Foi publicada esta semana a decisão do Tribunal Regional Federal (TRF) de Brasília que reconhece a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) como responsável pela liberação comercial de transgênicos, por maioria de votos e não por unanimidade

Como já afirmado neste Boletim, a decisão não é final e cabem ainda recursos, sendo que o Idec e o Greenpeace já afirmaram que irão recorrer.

Com a decisão, diz a Justiça que um órgão vinculado ao Ministério de Ciência e Tecnologia deve ser o único com atribuição e poder deliberativo em assuntos relacionados à saúde e ao meio ambiente. A CTNBio passa então a ter o papel de vários ministérios, desrespeitando frontalmente a Constituição Federal (Art. 76) que diz que estes são os principais órgãos auxiliares do Presidente da República.

Com a decisão final sobre transgênicos concentrada sob responsabilidade da CTNBio, fere-se também o princípio da competência compartilhada entre União, Estados e Municípios, também previsto constitucionalmente. A União não pode excluir os demais entes da federação do processo de gestão ambiental e de saúde pública, sob pena de ferir o pacto federativo. Nada disso parece ter sido levado em conta na decisão do TRF.

São gastos cerca de 300 milhões de dólares para se desenvolver uma planta transgênica, e as poucas e grandes empresas do setor não querem ver seus investimentos ameaçados por nenhum tipo de avaliação de risco. Elas, que deveriam ser as primeiras interessadas em demonstrar a egurança de seus produtos, fazem de tudo para evitar tais avaliações. Será que é porque sabem que são incapazes de provar que as sementes transgênicas, que aumentam as vendas dos agrotóxicos que elas mesmas produzem, não apresentam riscos à saúde humana e ao meio ambiente? E a melhor forma de garantir seus interesses aqui é colocar a decisão nas mãos da CTNBio, que em sua trajetória já deu várias demonstrações de jogar abertamente a favor da liberação rápida e facilitada dos transgênicos.

Sob a relatoria do senador paraibano Ney Suassuna, o Senado Federal está preparando um novo texto para o projeto de lei de Biossegurança. Nele, o centro do debate, como na Justiça, continua sendo a definição das atribuições dos ministérios e da CTNBio nas concessões para uso e comercialização de transgênicos.

E como a competência da CTNBio está no centro das atenções, vale transcrever trecho do voto do desembargador João Batista Moreira do TRF, que votou pela exigência do EIA/RIMA (Estudo e Relatótio de Impacto Ambiental) e questionou a legitimidade da referida comissão, nos seguintes termos:

"Acontece que a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, ressente-se de suficiente legitimidade democrática e não possui independência para decidir a matéria em caráter conclusivo e vinculante, uma vez que composta de membros designados discricionariamente pelo Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia, sem controle do Poder Legislativo.

É evidente a vulnerabilidade dessa entidade decisória às pressões políticas e econômicas. Seus membros estão humanamente sujeitos, mais que nas agências reguladoras, a cooptação por grupos de interesses, justamente num setor econômico que envolve vultosos investimentos e lucros transnacionais. Não é preciso ir longe para constatar essa vulnerabilidade. Basta ver que no governo anterior era ostensivo o interesse da União, por meio do Poder Executivo - que designa os membros da entidade -, na liberação do cultivo da soja geneticamente modificada. Lembre-se que até houve veemente sustentação oral em favor da manutenção do ato da CTNBio, ao início do julgamento, pelo ilustre Sub-Procurador-Geral da União."

Precisamos agora acompanhar atentamente essas movimentações e colocar pressão sobre os senadores para que esta lei, que terá sérias implicações também de ordem econômica, política, social e cultural, mantenha os deveres do Estado de garantir a qualidade ambiental e a saúde pública, bem como de defender os interesses do País.

Boletim 224 - 03 de setembro de 2004
Campanha Por um Brasil Livre de Transgênicos
E-mail: rb.gro.atpsa@socinegsnartedervil

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