Brasil: análise do projeto substitutivo de Biosegurança do senador Osmar dias, pelo cientista Rubens Nodari

"Os órgãos de registro e fiscalização, segundo o Substitutivo, não poderão fazer exigências que extrapolem as condições estabelecidas na decisão da CTNBio nos aspectos relacionados à biossegurança. Isto torna praticamente inóquo os dispositivos pelos quais os órgãos de registro e fiscalização podem ser consultados, tendo que biossegurança envolve questões ambientais, de saúde, dentre outras"

PRINCIPAIS PROBLEMAS DO SUBSTITUTIVO DO SENADOR OSMAR DIAS:

1) No art 5o, inciso IX, proíbe a liberação no meio ambiente de OGM ou seus derivados, sem a decisão técnica favorável da CTNBio ou sem o licenciamento do órgão ou entidade ambiental responsável, quando provocados pela CTNBio.

Tal dispositivo:

a) retira completamente as competências do MS, MAPA, SEAP e MMA para avaliarem a liberação comercial de OGMs. Em contrario sensu permite a liberação comercial independentemente da análise do MS, MAPA, SEAP ;

b) contraria o art. 200 CF que dá competência ao SUS para controlar e produtos de interesse da saúde e executar as ações de vigilância sanitária, em razão de que o MS/ANVISA não será consultada;

Conforme o previsto no Substitutivo a CTNBio é quem provocará os órgãos de registro e fiscalização para que estes possam desempenhar suas funções. Os órgãos de registro e fiscalização passam a atuar apenas se convocados pela CTNBio.

De outro lado, a atuação do CNBS (Conselho de Ministros) também é modificada. Ele não mais aprecia todas as liberações comerciais. No caso previsto neste artigo, ele agirá quando o processo for por ele avocado ou a pedido da CTNBio.

2) O dispositivo previsto no art. 8o isenta a aplicação da Lei de Agrotóxicos (Lei nº 7.802/89) sobre OGMs, inclusive para a liberação comercial. Tal norma permite que alimentos que contenham substâncias químicas com função de agrotóxicos sejam produzidos e comercializados sem a análise específica prevista pela Lei de Agrotóxicos. Lembre, ainda, que a MS/ANVISA, o MMA/IBAMA e o MAPA somente poderão se manifestar sobre a liberação de um OGM quando forem convidados pela CTNBio.

Isto significa que testes de carcinogênese ou ecotoxicidade não deverão ser exigidos em alimentos contendo substâncias afins a agrotóxicos.

3) Destaca-se que dentre as competências do Conselho de Ministros - CNBS (Art. 9º , § 1º, inciso II) está a análise de aspectos de interesse nacional, contudo condicionada à decisão da CTNBio.

Embora tendo como prerrogativa de avocar e decidir em última e definitiva instância, a decisão do CNBS terá como base a manifestação da CTNBio e, quando (o CNBS) julgar necessário, dos órgãos e entidades. Neste sentido, a manifestação do MS/ANVISA, MAPA, SEAP e MMAIBAMA não é requisito para deliberação do CNBS, que poderá decidir somente com base na fundamentação da CTNBio.

4) Pelo Substitutivo (art. 9, §2º), o CNBS tem o prazo de até 30 (trinta) dias, da data da publicação da decisão da CTNBio, para avocar o processo e deliberará no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias a contar da data de protocolo do processo em sua Secretaria, sendo considerada definitiva a decisão da CTNBio em caso de não obediência desses prazos.

Como conseqüência, caso seja verificado problemas causados por um OGM posteriores a uma liberação, o CNBS fica impedido de avocar a si uma reavaliação, pois esta segunda possibilidade de análise é concedida, exclusivamente a CTNBio. Desta feita, concede-se a CTNBio poderes extremos, ficando o todo o Poder Público (Conselho de Ministros, o MSaúde/ANVISA, MAPA, SEAP e o MMA) submisso à decisão de um Colegiado, mesmo existindo questões de interesse nacional.

Como visto o dispositivo (§ 2º do mesmo artigo 9o) impõe ao Conselho de Ministros prazo exíguo (45 dias) para avaliação de matérias de muita complexidade. Destaca-se que caso entendam os Ministros podem solicitar a análise do MS/ANVISA, MAPA, SEAP e do MMA/IBAMA (que de acordo com o Substitutivo, somente serão ouvidos caso convidaos pela CTNBio). Mesmo assim, tem o CNBS prazo reduzido de 45 dias para se manifestar, sob pena de valer a decisão da CTNBio.

O Substitutivo, cria, ainda, um vácuo de 30 dias onde todo e qualquer processo ficará a espera de manifestação do CNBS, que poderá não acontecer.

5) O Substitutivo, em seu Art. 10, retira seis ministros na composição do CNBS, passando de quinze para nove membros. O único critério explicitado para redução foi o da agilidade, não sendo mencionado qualquer justificativa técnica para a retirada da área social, da área econômica e área de defesa, com importantes papéis a desempenhar no CNBS, tendo em vista as prerrogativas de tal Conselho.

6) O Substitutivo dá a CTNBio atribuição para decidir tecnicamente (Art. 11), sobre proteção da saúde humana, dos animais e das plantas e do meio ambiente, retirando, por completo, as competências do MS/ANVISA/ANVISA, MAPA, SEAP e MMA/IBAMA.

Ou seja, a CTNBio, colegiado que se reúne esporadicamente cabe decidir sobre inúmeras matérias, devendo todo os demais órgãos do Poder Público, especializados em saúde humana, animais, plantas e meio ambiente obediência ao decidido pelo CTNBio, embora arquem com o ônus destas decisões, visto que é imcumbência daqueles registrar e fiscalizar o deliberado pela CTNBio.

7) A composição da CTNBio (Art 12), segundo o Substitutivo, diminui a representação da área ambiental da área vegetal e inclui representação da área de biologia molecular e tecnologia de alimentos, mas aumenta a participação do MAPA de 2 para 3 membros. Retira também o representante do Ministério do Desenvolvimento social e de Combate a Fome para incluir um segundo representante do setor de biotecnologia, quando o colegiado é de biossegurança.

As decisões de relevante importância sobre saúde, meio ambiente, agricultura em termos de biossegurança poderão ser tomadas por apenas 8 membros do colegiado, e não mais pela sua maioria absoluta como exigido no PL da Câmara.

8) No Art. 15, inciso II, a CTNBio terá atribuição de criar normas para a liberação comercial de OGMs, regrando sozinha tais atividades, invadindo atribuições dos demais órgãos públicos. Outra mudança substancial é a competência da CTNBio que passa a "emitir decisões" ao invés de emitir pareceres como no PL aprovado na Cãmara atualmente. Repete-se aqui outro dispositivo que dá a CTNBio atribuição para decidir tecnicamente, sobre proteção da saúde humana, dos animais e das plantas e do meio ambiente, retirando, por completo, as competências do MS/ANVISA/ANVISA, MAPA, SEAP e MMA/IBAMA.

Desta maneira, outro dispositivo reforça a incumbência da CTNBio, colegiado que se reúne esporadicamente, decidir sobre inúmeras matérias, devendo todo os demais órgãos do Poder Público, obediência.

9) Na mesma direção, o § 1º do Art. 15 determina que a decisão fundamentada prévia vincula toda a administração pública.

10) O art. 15 §2º refere que o MAPA, o MS/ANVISA, a SEAP e o MMA/IBAMA só poderão se manifestar nos casos de liberação comercial quando a CTNBio entender necessário. Ou seja, as demais legislações existentes no ordenamento jurídico brasileiro somente se aplicam caso a CTNBio entender necessário.

11) Embora o § 4º do Art. 15 permite aos órgãos públicos, apenas recorrer a própria CTNBio, julgará novamente o mesmo tema

12) Ao contrário do que prevê o texto aprovado na Câmara, as audiências públicas no caso de liberação comercial deixam de ser obrigatórias para serem facultativas (Art. 16).

13) Outro dispositivo também prevê que a CTNBio decide (Art. 17), não mais emite mais parecer como no PL aprovado na Câmara.

14) O Substitutivo, por meio do Art 17, § 1º, III, dá atribuição à CTNBio para deliberar sobre a necessidade ou não de licenciamento ambiental.

Da mesma forma, o Substitutivo trata apenas da hipótese de licenciamento ambiental de atividades potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, não dispondo sobre as demais atividades sujeitas ao licenciamento ambiental, nem tampouco definido quem é responsável pelo mesmo.

Destaca-se que as atividades potencialmente causadoras de significativa degradação do meio ambiente, dependerão de licenciamento ambiental mediante a realização de Estudo Prévio de Impacto Ambiental - EIA/RIMA, sendo que as atividades potencialmente poluidoras, mas que não possam causar significativo impacto, também dependerão de licenciamento ambiental, contudo sem a necessidade de realização de EIA/RIMA.

15) Além dos inúmeros poderes previstos para a CTNBio, que também incluem-se (art. 17 §2º) também a de retirar as competências de outro Conselho, como o CONAMA.

16) O art. 17, § 1º, inciso III refere que somente cabe ao MMA emitir as autorizações e registros e fiscalizar produtos e atividades que envolvam OGM e seus derivados a serem liberados nos ecossistemas naturais, bem como o licenciamento, nos casos em que a CTNBio deliberar, na forma desta Lei, que o OGM é potencialmente causador de significativa degradação ao meio ambientes. Trata-se de grave erro conceitual.

Estão sujeitas ao licenciamento ambiental elencado no art. 10 da Lei nº 6.938/81, empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental. Segundo o art. 225, da Constituição Federal, toda a atividade potencialmente causadora de significativa degradação ambiental dependerá da realização de estudo prévio de impacto ambiental. Contrariando frontalmente o art. 225 da CF, o Substitutivo restringe o licenciamento ambiental para ecossistemas naturais em casos que a CTNBio entender necessário.

Se mantido o que este previsto no Substitutivo, de todas as atividades e empreendimentos desenvolvidos no Brasil, somente aqueles desenvolvidos com OGMs e seus derivados poderão, mesmo que potencialmente poluidores, se instaram e operarem em nosso País sem o prévio licenciamento ambiental.

Contudo, na hipótese acima, incorrerão no crime tipificado no art. 60 da Lei dos Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/98) aqueles que isentarem de licenciamento ambiental as atividades potencialmente poluidoras. O imbróglio jurídico não só permaneceria, mas poderia aumentar.

18) Refere o art. 17, §5º, § 5º que as autorizações e registros de que trata esse artigo estarão vinculadas às decisões da CTNBio correspondente, sendo vedadas exigências técnicas que extrapolem as condições estabelecidas naquela decisão nos aspectos relacionados à biossegurança.

Os órgãos de registro e fiscalização, segundo o Substitutivo, não poderão fazer exigências que extrapolem as condições estabelecidas na decisão da CTNBio nos aspectos relacionados à biossegurança. Isto torna praticamente inóquo os dispositivos pelos quais os órgãos de registro e fiscalização podem ser consultados, tendo que biossegurança envolve questões ambientais, de saúde, dentre outras.

Rubens Onofre Nodari
Gerência de Recursos Genéticos
SBF - Ministério do Meio Ambiente
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