Brasil: sustentabilidade na produção e consumo de alimentos, por Sezifredo Paz
O Consultor técnico do Idec e Secretário Executivo do Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa do Consumidor, Sezifredo Paz, participou do 17o. Congresso Mundial da Consumers International, entidade que congrega associações de consumidores de 115 países
O Congresso foi realizado em Lisboa, entre os dias 13 e 17 de outubro.No Congresso, Sezifredo apresentou a palestra "Sustentabilidade na produção e consumo de alimentos: o papel das associações de consumidores", cuja íntegra reproduzimos abaixo.
"Sustentabilidade na produção e consumo de alimentos: o papel das associações de consumidores"
De todos os direitos dos consumidores, o mais desafiador é o direito a um ambiente saudável. Não falo apenas do ambiente do ponto de vista ecológico, mas também do ponto de vista social e ético. Esse direito se descola da visão antropocêntrica para a de um valor mais elevado de direito humano e holístico, para nós, para os outros seres vivos do planeta e para as futuras gerações, numa visão ecocêntrica.
Hoje alguns de nós já temos a consciência de que nos últimos cinqüenta anos a humanidade criou uma catástrofe social e ambiental. Os resultados desse erro foram a enorme concentração da renda, o desemprego, a miséria absoluta e a fome de quase um bilhão de pessoas, as alterações climáticas, a poluição das águas, a deterioração do solo, a diminuição da diversidade biológica, o esgotamento crescente dos recursos naturais, o comprometimento irreversível da nossa saúde pelo efeito dos produtos químicos, a insegurança social, entre outros males.
Essa tragédia da nossa civilização deu-se em nome de um grande equívoco: o desenvolvimento ou o crescimento econômico a qualquer custo, baseado em uma produção insustentável e no consumo egoísta.
A primeira premissa, portanto, da minha abordagem é uma proposta: temos que contar isto a todos os consumidores que ainda não sabem. Eles têm o direito de ser informados e o dever de agir contra essa situação.
Eles precisam saber que a moderna versão do ?progresso?, a globalização, está levando a uma concentração do mercado da produção e comercialização de bens essenciais sem precedentes, como ocorre com os alimentos. O direito humano à alimentação está sendo cada vez mais subordinado aos interesses de meia dúzia de corporações empresariais globais, que querem dominar a produção de sementes e de todas as suas formas de obtenção , continuando a vender os seus agrotóxicos e outros insumos e ainda cobrando royalties de produtos e tecnologias patenteados. Outras corporações, já concentram, em grande escala também, a industrialização e o comércio internacional de alimentos.
Lamentavelmente, governos de nações poderosas e de algumas em desenvolvimento, que deveriam promover a justiça e o desenvolvimento social, acabam sendo promotores dos interesses dessas empresas.
O poder econômico, que leva a apropriação da ciência e o impedimento de uma sólida regulamentação do controle dos riscos ambientais e sanitários, é a principal estratégia dessas empresas. Mas elas também utilizam outras formas de impor seus interesses, como o domínio das patentes , o uso indevido da engenharia genética e outras tecnologias, a normalização a seu favor no âmbito da OMC (Codex Alimentarius, Organização Internacional de Epizootias e a Convenção Internacional de Proteção Fitossanitária) , o marketing enganoso e abusivo, inclusive pelos meios de comunicação de massa. Fechando o cerco, fazem um ?lobby? monumental sobre os governos nacionais.
Mas não basta apenas informar os resultados, os responsáveis e suas estratégias, é necessário apontar uma perspectiva de abordagem do problema.
Sem dúvidas, a alternativa ? que poderia se contrapor em grande escala aos alimentos obtidos pelo uso intensivo de agroquímicos, aos transgênicos e a esse modelo insustentável - são os alimentos orgânicos e os seus vários matizes (agroecológicos, agrofamiliares e biodinâmicos).
Alguns motivos para essa escolha são mais que suficientes: a produção sustentável de alimentos respeita o meio ambiente, os valores sociais e protege a saúde dos consumidores. Porém, a mudança do ?paradigma da degradação? para o ?paradigma da sustentabilidade? é algo bastante complexo. Não é uma tarefa de um único segmento (agricultores, ambientalistas, consumidores ou governantes), mas nós, consumidores, podemos ter um papel decisivo de influenciar essa mudança: para um modo social e ambientalmente correto de consumir, há um modo social e ambientalmente correto de produzir.
Fuente: IDEC