Entrevista: Carlos Rossetto: A agricultura convencional é mais vantajosa para o povo

Carlos Jorge Rossetto, 63 anos, Doutor em Agronomia, é pesquisador científico do Instituto Agronômico de Campinas há 41 anos. Trabalhou com resistência de variedades de plantas a pragas e moléstias e melhoramento de soja e manga. Não faz pesquisas com plantas transgênicas e é contra a liberalização da soja transgênica resistente ao herbicida Roundup, produzido pela Monsanto. Leia a seguir, a entrevista que Rossetto concedeu ao Expresso Zica desta semana.

Expresso Zica - Qual sua opinião sobre a MP 113 e sobre a possibilidade de liberalização da produção de transgênicos no Brasil?

Carlos Rossetto - Creio que o Presidente da República, através da MP 113, autorizou a comercialização dos grãos de soja transgênicos já produzidos para evitar um grande prejuízo aos sojicultores gaúchos. Haverá agora um debate nacional que deverá auxiliar o Governo e o próprio povo brasileiro a se posicionar melhor. Quanto à possibilidade de liberar a produção de transgênicos, no caso específico da soja tolerante ao herbicida Roundup (Glifosato), sou contra. Transgênicos é uma expressão muito ampla, abrangente. Todo gene tem um efeito principal, mas a inserção de um gene em determinada célula terá efeitos colaterais, ou seja, outros efeitos do mesmo gene. Não é fácil provar que um gene introduzido numa planta, dando origem a uma planta transgênica, não apresenta problema adverso à saúde humana. No máximo pode-se afirmar que nos testes feitos não foram constatados efeitos adversos. Por mais testes que se façam a dúvida persistirá.

Expresso Zica - Quais os prejuízos desta soja resistente ao Roundup para a saúde das pessoas?

Rossetto - O herbicida Roundup é absorvido pelas folhas da planta. Na cultura da soja normal, convencional, não transgênica, o Roundup, se utilizado, só pode ser aplicado antes do plantio, ou antes da germinação das sementes da soja. Se for aplicado na lavoura de soja já germinada, as folhas de soja serão atingidas, absorverão o herbicida e a soja morre. Por esta razão é mais difícil existir resíduo do herbicida Roundup nos grãos dessa soja. No caso da lavoura de soja transgênica tolerante ao Roundup, o agricultor pode aplicar o herbicida depois que a soja já germinou, porque ela é tolerante ao herbicida. Este será então absorvido pelas folhas, não mata a planta e uma parte vai para os grãos de soja. A expectativa lógica é que a soja transgênica tenha mais Roundup no grão que a soja normal.

Expresso Zica - E para o meio ambiente?

Rossetto - A quantidade de Roundup que será usado na cultura da soja transgênica é maior que na cultura normal. O uso de Roundup, como qualquer outro produto químico aplicado no ambiente, pode provocar efeitos ambientais. Certa vez um especialista em anelídeos me disse que se os homens soubessem como ficam as minhocas em solos tratados com Roundup eles jamais o utilizariam. Temos que ter equipes organizadas de especialistas fazendo esse tipo de estudo e hoje não temos. O correto seria colocar uma taxa sobre o preço do herbicida para pagar os especialistas que vão estudar durante vários anos o seu impacto ambiental. O próprio herbicida deveria pagar pelo estudo do seu impacto ambiental.

Expresso Zica - A MP 113 exige que a soja liberada para venda seja rotulada para que o consumidor saiba que está comprando soja transgênica. Como é feita a diferenciação entre a soja trangênica e a soja convencional? É possível que todos os agricultores façam esta rotulagem?

Rossetto - Os agricultores, em tese, poderiam fazer o teste e rotular. Mas a soja desse agricultor que fez o teste e rotulou, é misturada com a soja produzida por outros agricultores cooperados. Na forma de semente, o único teste para diferenciar a soja transgênica da normal é teste químico. Estão usando um kit importado, que tem um custo. Ela deveria, portanto, pagar esse custo da rotulagem com uma taxa de rotulagem já descontada do preço de venda de toda soja transgênica. A verdade é a seguinte, os transgênicos só serão mais econômicos se tiverem todos os custos extras que acarretam, rotulagem, fiscalização, jurídicos, royalties, patentes, análise de resíduo, impacto ambiental, financiados de forma subsidiada pelo povo brasileiro e pelo Governo. Do contrário, a agricultura normal, convencional é em geral economicamente mais vantajosa para o povo brasileiro.

Expresso Zica - O que acha do fato de o Governo deixar a escolha nas mãos do consumidor, tirando esta questão do âmbito da saúde pública?

Rossetto - No caso das plantas transgênicas tolerantes a herbicidas, que, além da transgenia, trazem uma problemática de aumento de resíduo químico de herbicida no alimento, eu sou favorável à edição de uma lei que proíba a utilização desse tipo de planta transgênica no Brasil. No caso de outros transgênicos, como por exemplo, um arroz transgênico que seria rico em vitamina A, eu deixaria a escolha nas mãos do consumidor. E os consumidores, com justa razão, têm preferido os alimentos não transgênicos. É uma posição lógica, consciente, racional. Como sempre haverá uma dúvida sobre a inocuidade dos transgênicos para a saúde humana, a posição mais segura para o consumidor é evitar seu consumo.

Expresso Zica - O senhor defende o uso de trangênicos em algum caso?

Rossetto - Eu vejo os transgênicos como outras áreas da ciência e tecnologia. A tecnologia das plantas transgênicas é um poderoso mecanismo que pode trazer grande progresso e conforto para a humanidade. Mas está sendo apropriado por grandes empresas que querem dominar a agricultura do mundo. Vejo os transgênicos de uma forma global. Por um lado, tem potencial para resolver grandes problemas da humanidade, na agricultura, na pecuária, na medicina, na saúde pública e na indústria. Por outro lado, é um odioso instrumento de opressão, de dominação, criador de desequilíbrio social no mundo, tornando os ricos mais ricos e os pobres mais dependentes e mais pobres.

EXPRESSO ZICA é um boletim eletronico, do deputado Federal Zica, PT-SP
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