Governo brasileiro rejeita rotulação mais rigorosa de transgênicos no comércio internacional

Idioma Portugués
País Brasil

Classificada de retrógrada, posição brasileira contradiz legislação nacional e deixa dúvidas sobre compromisso do país em manter negociações internacionais sobre biodiversidade

O Brasil e a Nova Zelândia foram os únicos paises que se opuseram à adoção de regras claras para a identificação de alimentos e outros produtos transgênicos exportados. A divergência veio a público durante a plenária final da II Conferência das Partes Signatárias do Protocolo de Cartagena sobre a Biossegurança, no último dia 3 de junho, em Montreal, no Canadá. A decisão de rotular os produtos transgênicos comercializados internacionalmente de forma mais explícita foi rejeitada porque precisava da aprovação de todos os países representados no evento para sair do papel.

Com isso, as negociações para tornar mais rigorosas a rotulagem foram paralisadas. Continua valendo, portanto, a regra pela qual cada carregamento de um produto traz apenas a inscrição genérica “pode conter” (may contain) transgênicos. O encontro de Montreal foi realizado especificamente para discutir o manuseio, transporte, embalagem e identificação de produtos transgênicos destinados ao consumo, por exemplo, em alimentos e rações veterinárias. A intenção do evento era chegar a um consenso para que a rotulagem especificasse a quantidade e que tipo de transgênico cada carga contém.

Por conta da divergência, o evento foi considerado um fracasso. Ao contrário da posição manifestada no Canadá, a legislação brasileira exige a rotulagem de produtos transgênicos ( saiba mais). Além disso, a obstrução do acordo está sendo entendida como indicador de dificuldades nas negociações futuras sobre o tema. Desta forma, criou-se certo constrangimento para o Brasil, que irá sediar, em março do ano que vem, em Curitiba(PR), a VIII Conferência das Partes (COP) da Convenção da Diversidade Biológica e a III Conferência das Partes Signatárias do Protocolo de Cartagena sobre a Biossegurança.

A delegação brasileira presente à Conferência em Montreal, na verdade, seguiu a posição adotada pela Nova Zelândia, que é o porta-voz do chamado “Grupo de Miami”, conjunto de sete países que defendem a maior liberalização possível no comércio de transgênicos. Acusada de ter sido influenciada pelo lobby das grandes empresas de biotecnologia e condenada por um manifesto de organizações da sociedade civil latino-americanas (confira abaixo), a posição brasileira também foi classificada de inusitada e retrógrada pelos outros países representados no encontro.

“A implementação do Protocolo tem que ser feita passo-a-passo, seguindo um ritmo adequado e realista, em um processo que exigirá muita negociação”, afirmou o representante do governo brasileiro, ministro Hadil Fontes da Rocha Vianna. Ele surpreendeu a todos ao concluir seu discurso com uma acusação genérica e vaga, afirmando guardar "fortes reservas" quanto à maneira como a reunião foi conduzida. Vianna não fez nenhuma referência à proteção da megabiodiversidade brasileira e ao princípio da precaução, que indica que quando não se conhece exatamente as conseqüências ambientais e sanitárias do consumo e da produção de um produto, ele não deve ser comercializado enquanto não forem feitas pesquisas que comprovem a sua viabilidade.

Depois da fala do diplomata brasileiro, os 25 países da União Européia, seguidos pelo México e Panamá, criticaram e lamentaram o fracasso da reunião, justamente no ponto mais central para a implementação do Protocolo.

Nos fóruns internacionais sobre o tema, existe a expectativa que o Brasil assuma a liderança e a defesa dos interesses das chamadas nações megadiversas (com as maiores diversidades biológicas do mundo). Os Organismos Geneticamente Modificados (OGMs) são considerados uma ameaça à biodiversidade. Com a posição adotada em Montreal, o Brasil isolou-se do grupo dos megadiversos nas discussões da Convenção sobre a Diversidade Biológica (CDB). Ao mesmo tempo, também se espera que o País enfrentará a oposição explícita de todos os outros membros do "G-20", grupo importante para o Brasil nas negociações da Organização Mundial do Comércio (OMC) formado, entre outros, por Egito, Índia, China, África do Sul, México e Malásia.

“A posição brasileira nas discussões internacionais sobre meio ambiente está sendo desmoralizada paulatinamente. Tanto a Lei de Biossegurança, quanto a ação do governo federal em outros temas, como no caso dos desmatamentos, vem contribuindo para isso,” alerta Jean Marc von der Weid, coordenador da campanha Por um Brasil Livre de Transgênicos. Ele conta que, apesar do prestígio da ministra Marina Silva funcionar como uma espécie de blindagem, as organizações ambientalistas internacionais começam a virar suas baterias contra o governo Lula.

Oswaldo Braga de Souza com a colaboração de David e Gisela Hathaway.

Fuente: ISA

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