Brasil: Lula deve editar MP liberando soja transgênica
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva está inclinado a editar uma medida provisória liberando o plantio de sementes de soja transgênicas em todo o país na safra 2003/2004
BRASÍLIA. Após reunião de duas horas no Palácio do Planalto, o governador do Rio Grande do Sul, Germano Rigotto (PMDB), saiu convencido de que o governo federal vai liberar o plantio.
O senador Paulo Paim (PT-RS), que estava no encontro, também acredita na liberação, mas ressaltou que Lula avisou que conversaria antes com a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, que é contra a liberação indiscriminada dos transgênicos. O porta-voz da Presidência, André Singer, foi evasivo, afirmando apenas que Lula decidirá a questão nos próximos dias.
- O presidente disse que tem uma decisão a tomar e que vai tomá-la. Deve sair uma medida provisória liberando o plantio para essa safra e, ao mesmo tempo, o presidente mandará ao Congresso, em caráter de urgência, projeto de lei regulamentando a questão dos transgênicos para o futuro e em caráter decisivo - disse Paim, explicando que para Lula "caberá ao Congresso a decisão sobre a política futura para os transgênicos".
- Pelo que senti, o presidente está consciente dos problemas que vamos ter sem uma solução para essa safra. Se ele está consciente, a decisão dele será a mais correta, que é a de dar a possibilidade de os produtores utilizarem sementes (transgênicas) que eles já têm hoje - acrescentou Rigotto, que veio a Brasília convidado por Lula, num jatinho da Força Aérea Brasileira (FAB).
Os gaúchos chegaram ao Planalto certos de que a decisão seria anunciada ontem. Mas as resistências da ministra Marina e algumas dúvidas jurídicas fizeram a decisão ser adiada. Lula viaja amanhã para os EUA e só retorna no dia 27.
Militantes do Movimento dos Sem Terra (MST) e de outras entidades contra os transgênicos fizeram um protesto em frente ao Planalto ontem. Com faixas, eles foram monitorados pela Segurança do Planalto e pela Polícia Militar. Os manifestantes também invadiram o gabinete do deputado Paulo Pimenta (PT-RS), favorável aos transgênicos.
Marina continua contra o cultivo do produto
BRASÍLIA. Segundo o senador Paulo Paim, o secretário-executivo do Ministério do Meio Ambiente, Claudio Langone, foi o único contrário à liberação do plantio de soja transgênica, dizendo que não tinha autorização para mudar posição pública da ministra Marina Silva de que é preciso debater mais a questão.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva então chamou Marina às pressas ao Planalto. No encontro, ela disse que não voltaria atrás. Lula então respondeu que ela poderia ficar à vontade para deixar pública sua postura, apesar da divergência.
Logo depois, o Ministério do Meio Ambiente divulgou uma nota. "O ministério entende que a atual legislação deve ser cumprida e que qualquer solução adotada deverá ter sustentação jurídica reiterando sua posição de defesa do princípio da precaução e do cumprimento da exigência constitucional da legislação ambiental", diz o texto.
Participaram da reunião os ministros José Dirceu (Casa Civil) e Luiz Gushiken (Secretaria de Comunicação), o governador gaúcho, os parlamentares gaúchos Paim, Pimenta e Darcísio Perondi (PMDB-RS), além do presidente da Comissão de Agricultura da Câmara, Josias Gomes.
Riscos ainda são debatidos
Os defensores dos alimentos geneticamente modificados dizem que eles podem aumentar a produção de comida, com maior produtividade e custos reduzidos, além de oferecer maior valor nutricional. Os críticos da biotecnologia rebatem dizendo que os alimentos trazem riscos à saúde e ao meio ambiente. A maioria concorda, no entanto, que serão necessários anos até que o real impacto dos transgênicos possa ser medido.
Até agora não há comprovação de que alimentos transgênicos prejudiquem a saúde. Nem mesmo no caso das plantas que receberam genes de micróbios - como a soja Roundup Ready, da Monsanto - ficou evidente que sejam capazes de provocar alergias ou outras complicações.
A discussão sobre os riscos ambientais é mais acirrada. Estudos já mostraram que a mudança genética pode afetar outras espécies - é o caso de plantas resistentes a insetos daninhos, que podem ser igualmente mortais para outras espécies de insetos essenciais. Outro risco é o da chamada poluição genética - as plantas transgênicas poderiam se misturar às convencionais, contaminando o meio ambiente, o que provocaria o desequilíbrio dos ecossistemas. Isso teria ocorrido no México.
O Globo, Brasil, 20-9-03