Brasil: os modificados, por Janio de Freitas

A soja transgênica que na semana passada teve o seu plantio proibido em toda a Bretanha, França, nas últimas semanas foi plantada (e continua sendo) em larga escala contra a proibição legal brasileira, no Rio Grande do Sul e no Mato Grosso do Sul

O plantio aqui é feito com base em duas leis, tipicamente brasileiras e opostas à da proibição: a lei da impunidade e a lei do fato consumado.

Assim como os donos do chamado agronegócio mandam a lei às favas (de soja e outras favas) e nisso retratam o valor da legislação, duas frases oficiais retratam o valor moral dos governantes.

Do presidente da Brasoja, maior negociadora sulina do grão, sobre a decisão dos grandes cultivadores de plantar a soja transgênica com ou sem aprovação da Lei de Biossegurança ou medida provisória de Lula: "O produtor não está preocupado com o que acontece em Brasília. O problema é do governo".

A transgressão da lei não é problema do transgressor, que nem reconhece a autoridade, ou simplesmente a existência, do governo.

Do ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, sobre a transgressão de ocupar milhões de hectares com um produto proibido: "O governo sabe disso. E não vai permitir que a ilegalidade persista".

Governante ciente de uma transgressão está obrigado a reprimi-la e aos autores, ou se torna ele próprio transgressor das leis que jurou defender. Será por isso que o governo, diz o ministro, "não vai permitir que a ilegalidade persista"? Não. Sua frase seguinte esclareceu que a ilegalidade seria "legalizada" por Lula "em uma questão de horas", por medida provisória. Tal como fez pouco depois de assumir.

Está certo, se entendermos que Lula e o PT atuais são também transgenicamente modificados.

Folha de São Paulo, Brasil, 12-10-04

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