Brasil: soja está "engolindo" floresta amazônica
Alerta foi feito pelo jornal The New York Times
O jornalista Larry Rohter, em artigo publicado esta semana no jornal norte-americano The New York Times alertou para o incentivo dado à cultura da soja no Brasil, especificamente na região amazônica, seguindo um onda mundial de cultivo desta espécie de grãos. O aumento de importância deste pólo agrícola começou a propiciar o desenvolvimento de vias em direção ao Norte do país que, mesmo não sendo novos, só agora passaram a receber maior atenção em virtude dos investimentos privados e aos projetos previstos pelo governo federal. Isto acabou gerando dois diferentes lados da moeda em relação ao avanço da soja na Amazônia: um dos produtores, interessados em melhorar a competitividade do produto do Centro-Oeste e incorporar novas áreas no Norte; e do outro as ONGs ambientalistas que argumentam que este avanço é uma ameaça à floresta e às comunidades amazônicas. Veja a íntegra do artigo:
Larry Rohter - "Basta apenas uma viagem pela estrada que leva ao norte para entender como uma área da selva amazônica, maior do que Nova Jersey, pode ter sido derrubada no decorrer de apenas um ano. Onde a selva oferecia abrigo aos papagaios, cervos e onças, a terra está sendo cada vez mais limpa para abrigar plantações de soja. O grão mais quente do momento no Brasil.
O cultivo da soja está em alta, guiado por uma coincidência da demanda global vinda de locais tão distantes quanto a China e a política local do Estado em que o novo governador era conhecido como Rei da Soja antes mesmo de sua eleição. Hoje, a soja está comendo porções cada vez maiores da Amazônia Legal, levando a um aumento no ano passado de 40% no desmatamento, elevando a área desmatada para quase 2 milhões de hectares. Até as pastagens onde as vacas ruminavam estão sendo convertidas, levando o maior rebanho do mundo ainda mais longe da fronteira agrícola.
"O novo fator na adequação do desmatamento da Amazônia é, sem sombra de dúvida, a soja e a atração que exerce sobre o agronegócio", disse Stephan Schwartzmann, diretor do grupo ecológico americano Defesa Ambiental, depois de visitar a região em julho.
Em temporada de seca pouco comum também parece ter efeito no aumento do desmatamento de agosto de 2001 a julho de 2002, segundo o Instituto Nacional de Pesquisa Espacial do Brasil.
Assim como o relaxamento na força policial, tradicional durante o ano de eleição, e uma moeda fraca que tornou a agricultura para exportação atraente, segundo sugeriam os analistas.
Mas os especialistas são unânimes em alertar que, à medida que o cultivo de soja continua a se espalhar por Mato Grosso e Pará, a ameaça ao sistema ecológico amazonense provavelmente vai piorar nos próximos anos.
Grupos ecológicos esperavam que o presidente de esquerda brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, tomaria medidas para combater o desmatamento. Mas Lula, em vez disso, incentivou o aumento da produção agrícola para aumentar as exportações e alimentar os pobres, uma posição que lhe valeu inclusive críticas de seus próprios aliados.
"A Amazônia não é intocável", disse Lula durante uma entrevista à região em julho. Essa visão é fortemente apoiada por Blairo Maggi, governador do Mato Grosso, que repetidamente negou qualquer preocupação sobre desmatamento. Maggi, eleito no ano passado como candidato do Partido Popular Socialista, e sua familia são donos de um dos maiores produtores, transportadores e exportadores de soja do Brasil. O Rei da Soja, como gosta de chamá-lo a imprensa brasileira, defende a soja como engrenagem de crescimento e desenvolvimento da Amazônia". (Reprodução de texto do jornal "New York Times")
Ambientalistas exaltam rejeição à produção
Grupos ambientalistas exaltaram a rejeição do Brasil à produção de soja modificada geneticamente, mas temem que a decisão leve a grandes perdas em relação à floresta amazônica. "O cultivo de soja vem se mostrando o maior causador de desflorestamento na Amazônia", afirmou William Laurance, do Instituto Smithsonian de Pesquisa Tropical, com sede no Panamá.
Andy Tait, do Greenpeace, acrescentou: "Ironicamente, a escolha do Brasil em produzir soja não modificada está resultando em enormes trilhas de terra devastadas".
Segundo produtor e exportador de soja do mundo, responsável por mais de 24% do movimento global, o Brasil vem resistindo à tendência dos Estados Unidos e de outros países em investir na produção de plantas geneticamente modificadas. Mas essa resistência traz vários perigos, diz Tait. "A contaminação está chegando da Argentina, um dos maiores produtores de soja geneticamente modificada. Muito da soja no sul do Brasil já está contaminada".
Derrubada de árvores
Os fazendeiros brasileiros que tentam cultivar a soja não modificada vêm sendo forçados a se mudar constantemente em direção ao norte e para as florestas, onde os métodos de cultivo industriais causam a derrubada de árvores.
"Historicamente, a Amazônia era devastada nas extremidades, mas agora o que está acontecendo é como se alguém entrasse diretamente (na floresta) e a picotasse", disse Laurance. Ele estima que, até 2020, cerca de 42% da floresta amazônica podem ter desaparecido ou sofrido grandes danos.
"Temos de perceber que a Amazônia, como a maior área de floresta intacta que resta no mundo, está para ser transformada por essas avalanches de projetos para acomodar o cultivo industrial da soja", disse Laurance.
A Amazônia cobre cerca de 7 milhões de quilômetros quadrados de terra, dos quais cerca de 5 milhões de quilômetros quadrados estão no Brasil. É responsável por uma quantidade maior de chuvas do que se supunha, e os ambientalistas temem que o desflorestamento ameace o suprimento de água mundial. Estudos também sugerem que a Amazônia pode estar absorvendo 8% do dióxido de carbono produzido pelo homem. (Reuters)
O Diário do PA, Brasil, 22-9-03